Ally e Ryan

Ally e Ryan

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Companhias aéreas não poderão cobrar pelo transporte de cadeiras de rodas


Cobrança começou a ser investigada em abril de 2012; Anac deverá fiscalizar e autuar empresas que descumprirem norma

A Justiça Federal determinou que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) exija das empresas aéreas brasileiras o transporte “gratuito e incondicional” de cadeira de rodas para passageiros com deficiência ou mobilidade reduzida, independentemente do peso e do local em que o equipamento for transportado. A Anac também terá que fiscalizar e autuar as empresas que descumprirem essa determinação.

A cobrança do transporte de cadeiras de rodas pelas companhias aéreas começou a ser investigada em abril de 2012, de acordo com o Ministério Público Federal, que moveu a ação civil pública. A mãe de um adolescente portador de atrofia cerebral procurou em outubro de 2012 a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), em São Paulo. Ela revelou que, sempre que viajava com o filho, era obrigada a pagar pelo transporte da cadeira. O custo chegou a R$ 130,00 em uma das viagens.




O MPF constatou, na época, que “as maiores aeronaves operadas pelas duas grandes companhias aéreas do Brasil são o Airbus A330 e o Boeing 777, que não possuem espaço no interior da cabine para o transporte de uma cadeira de rodas”. Sem poder transportar a cadeira de rodas na cabine, os cadeirantes se viam obrigados a pagar pela carga.

A Anac informou que ainda não foi notificada e que só se pronunciará após recebimento do processo. A Justiça Federal disse que a determinação valerá logo após a notificação, o que deve ocorrer na próxima semana. Há a possibilidade de a agência entrar com recurso.

Fonte: Estadão

domingo, 19 de janeiro de 2014

Como uma cachorra resgatada em estado terminal mudou vida de um garoto autista



A história é comovente e parece tirada de filme: Jonny Hickey era um menino de 8 anos, isolado e solitário, devido ao autismo de que sofre. Há alguns meses, uma pequena cadela foi encontrada em estado incrivelmente frágil na beira da estrada e foi acolhida por uma instituição de proteção de animais. Jonny e Xena, a cadela, acabariam por mudar a vida um do outro.
 
A luta e a recuperação extraordinária da cadela, uma mistura de Staffordshire Terrier e Pit Bull, lhe valeram o nome de Xena, a filhote guerreira, por ela ter sobrevivido depois de a morte a ter ameaçado. A sua fama chegou ao Facebook, onde tem milhares de seguidores, e a instituição decidiu fazer um encontro onde ela pudesse conviver com os admiradores e ser adotada. A honra coube à família de Jonny.
 
Hoje, passados apenas alguns meses, a mãe do menino não tem dúvidas de que o filho nunca foi tão feliz. Ele começou conversando, cantando e demonstrando, pela primeira vez, interesse no mundo que o rodeia. A família gastou milhares de dólares em terapia para Jonny, que afinal podia ser substituída por um outro remédio, bem mais simples e barato: a amizade leal que só um cachorro poderia oferecer.
 











Em abril, mês da Conscientização do Autismo e Prevenção da Crueldade contra os Animais, os dois gravaram um vídeo alertando para os problemas:
 
 




“Meu nome é Jonny e essa é minha filhote, Xena. Bem, Xena foi muito machucada por algumas pessoas más. E eu tenho autismo. Então acho que formamos um time perfeito para espalhar a ideia que devemos ser bons com os animais e com crianças como eu.”
 

Fonte:

 
 

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

As relações históricas entre deficiência e literatura


Emílio Figueira publica pesquisa sobre a relação de escritores com deficiência

Introdução
A literatura é uma forma que temos de ler a vida; não ler simplesmente por ler, mas sim, interpretando observando, descobrindo, refletindo, vivendo... Cada autor tem o seu universo (muitas vezes, particular) sensível e/ou intelectual para passar aos seus leitores. E com os portadores de deficiência, também não é diferente, sendo que muitas de suas obras ganham o mercado editorial brasileiro, enquanto outros tornam-se bet-seller. Exemplo disto, é o livro "Feliz Ano Velho" de Marcelo Rubens Paiva - um ingênuo mas emocionante relato sobre as aventuras adolescentes do autor e o acidente que o deixou paralítico. A obra vendeu 400 mil exemplares até 1986 - fez grande sucesso principalmente entre leitores de 15 a 25 anos -, tornando-se, inclusive, peça de teatro e filme.
No Brasil, já configuram-se muitos livros escritos pelas pessoas com deficiência. São obras que trazem em suas páginas, histórias, experiências, problemas, visões e opiniões de seus autores. Constituem-se em depoimentos importantes para os estudiosos e a sociedade em geral, embora muitos deles sejam de produção independente, não chegando ao nosso conhecimento.
Grande parte dessas obras constituem-se em autobiografias, onde os autores não se limitam apenas a registras os dados de sua existência, mas dão toques e temperos especiais, transformando-as em verdadeiras obras literárias. Passam a pertencer a literatura no sentido escrito, pois, esses autores, extravasando o seu eu, chegam a atingir uma linguagem poética, onde fatos de suas vidas são misturados com ideias, emoções e sentimentos.
Vale a pena notar que esses autores são pessoas e, como tais, não vivem soltos no ar, definindo suas relações com outras pessoas, o que faz deles seres sociais. Mesmo sendo muitos de seus textos frutos de suas experiências pessoais, esses escritores orientam-se pelo sistema de normas e valores que influenciam suas situações dentro e fora de seu ambiente cultural, o que refletem, fatalmente, em suas obras. É inegável que a obra literária e o ambiente cultural que a envolve, manterem íntimas relações, como também uma interação. Assim, acreditamos - e ficamos seguros de afirmar - que do mesmo jeito que são influenciados pelas circunstâncias ao escreverem essas autobiografias ou ficção - cujos temas são pessoas com deficiência e suas realidades -, os textos desses autores também exercem influências sobre seus leitores. E isto aumenta ainda mais o valor dessas obras para o nosso acervo cultural... E, visando documentar o passado e o presente dessas produções, é que elaboramos este e o próximo artigo!
Alguns apontamentos históricos
Na história mundial encontraremos vários fragmentos de pessoas com deficiências e suas relações com a arte. Alguns desses artistas nasceram com a deficiência, enquanto outros as adquiriram ao longo de suas vidas. Mas, fora da área das deficiências, interessante também é notar que grande parte dos escritores mundiais sempre tiveram doenças graves durante suas vidas - além de problemas psicológicos. Na literatura brasileira, só a exemplo de citação, foram inúmeros os autores consumidos pela tuberculose. Neste ensaio, entanto, vamos pegar alguns exemplos restritos ao campo literário, através de uma rápida viajem, de autores que tiveram deficiência.
Nossos primeiros apontamentos vêm da Grécia Antiga
Muito famoso, o físico e filósofo grego, Demócrito (470 a 360 a.C.) tinha como filosofia o conceito que devemos procurar tudo de bom que o mundo pode ter, dentro de um otimismo moderado e sem esquecer dos problemas inerentes a ele. Conta a lenda que, para meditar melhor, o pensador inutilizou os seus próprios olhos, pois, segundo historiadores, "expusera à luz de sol por muito tempo uma placa de cobre brilhante, fazendo incidir seus raios sobre seus olhos". Cícero (1873), quase quatro séculos após a morte de Demócrito, escreveu sobre ele: "Demócrito, após perder a visão, não podia mais distinguir o branco do preto; mas distinguia o bem do mal, o justo do injusto, o honesto do desonesto, o útil do inútil, o grande do pequeno. Pode-se ser feliz sem distinguir a verdade das cores, mas não se poderá sê-lo sem dominar ideias verdadeiras. Esse homem acreditava até que a visão era um obstáculo às operações da alma".
Infelizmente, suas obras não foram traduzidas para o português, chegando até nós. Mas Demócrito escreveu títulos interessantes, como por exemplo, "sobre a tranquilidade da alma", "sobre a natureza do homem", "sobre as causas das harmonia celestial", dentre outros.
Citamos Tirteu. Identificado como um dos poetas líricos mais expressivos da Grécia Antiga numa época em que a poesia era muito valorizada. Tirteu nasceu na Ática em meados do século VII a.C, sendo muito aceito nos meios atenienses mais cultos. Iniciou a sua vida como professor de uma escola ateniense, embora sofresse bastante com as limitações físicas marcantes que o obrigavam a claudicar significativamente. (Silva, 1987).
Também é na Grécia Antiga que vamos encontrar o mais famoso dos grandes poetas gregos, Homero, relatado por diversos escritores antigos sobre sua pessoa e a grandiosidade de suas obras. Autor dos poemas épicos Ilíada e Odisséia, era cego segundo a tradição e certamente viveu em épocas anteriores ao século VII a.C. Seus poemas eram verdadeiros quadros, retratando lugares, praias, paisagens da Grécia, tipos de combates, estratégias de batalhas, manobras navais, movimentos de homens e de animais são tão fielmente retratados em sua poesia, que parece nos colocar sob os olhos o que ele mesmo não havia visto! "O que é, então, que faltou a esse grande gênio não mais do que a outros homens verdadeiramente sábios, para aproveitar todos os prazeres de que a alma é capaz?" (Cícero, 1873).
No contexto de mitologia existem inúmeras situações, um tanto quanto irreais, que em suas narrativas apresentam algumas anomalias ou deficiências que por vezes são características principais de seus deuses e personagens. Isto se reflete na literatura grega, onde é grande o número de citações de pessoas com deficiência. O próprio Homero faz inúmeras descrições em seus poemas dessas pessoas desempenhando funções com grande sucesso. Em um exemplo, ele fala de Hefesto (um deus com deficiência, senhor do fogo e da forja), um ser superior com deficiências nas pernas e indicado como exímio artífice e magnífico ferreiro, criador de obras primas como a couraça de Hércules, as flechas de Apolo, o escudo de Aquiles. "Lenda provavelmente indicava dos costumes e usos da sociedade de então, cinco séculos antes da época de Hipócrates", Silva, 1987.
Outra citação de Homero, é Demódoco, ou contador de histórias e de rapsódias, além de cantor de voz agradável, que, segundo o autor, "ao qual, mais do que a ninguém, a divindade outorgou o dom de deleitar com seus cantos, seja qual for o assunto que seu coração lhe inspire... (...) Entre todos querido da Musa, a qual lhe dera, a um tempo, o bem e o mal, pois, o privara da visão e lhe concedera o melodiosa canto". (Homero, l981).
Tirésias, adivinho cego, muito famoso, proveniente da vila de Tabas, também é citado por Homero. Podendo ser encontrada em diversas outras obras gregas, essa história reafirma o velho estigma que a cegueira não é só um mal, mas um castigo também, pois, segundo a lenda, Tirésias revelou à humanidade os segredos do Olímpio, sendo punido pelo seu ato.

Segundo Silva (1987), "as aplicações de vida prática nas obras literárias são muito comuns e certamente influenciaram também os escritores gregos. Os exemplos citados acima, que são apenas uma ilustração retirada das obras de Homero, deixam-nos a impressão de que pessoas com deficiência tinham seu lugar na sociedade produtiva grega, desde que exercendo funções à sua altura. O próprio Homero é um incrível exemplo de competência".
* * *
Outro ilustre convidado deste ensaio, é o poeta épico português por excelência, Luís de Camões (1524 a 1580). Foi militar, servindo em Marrocos entre os anos de 1545 a 1548, ocasião em que perdeu um de seus olhos em escaramuças com os marroquinos. De volta a corte em Lisboa, sua deficiência passou a ser motivo para algumas brincadeiras e zombarias por parte de uma jovem, a qual o chamava de "cara sem olhos", sendo a mesma o grande amor do poeta. Sentindo a agulhada do comentário, Camões, até então com 25 anos de idade, transformou o fato em um galanteio com os seguintes versos dirigidos à mimosa dama:
"Sem olhos vi o mal claro
Que dos olhos se surgiu:
Pois cara sem olhos viu
Olhos que lhe custam caro.
De olhos não faço menção,
Pois quereis que olhos não sejam
Vendo-os, olhos sobejam,
Não vos vendo, olhos não são..."
Segundo Silva (1987), "a deficiência, que poderia ter arruinado a vida de um jovem galante, não prejudicou nem a vida guerreira e aventuresca, nem a vida literária de Luíz de Camões que muito anos mais tarde, após infindáveis viagens para Goa, Malabar, Meca, Índia, China, Málaca, Ilhas de Malásia, Moçambique e outros lugares, escreveu a epopeia portuguesa que intitulou de Os Lusíadas", uma das mais significativas epopeias da literatura universal, escrita em 10 cantos (parte em que se dividem os longos poemas), 1.102 estrofes, totalizando 8.816 versos decassílabos com o seguinte esquema de rimas: ab ab ab cc.
Luís Vaz de Camões manifestou o espírito do Renascimento através de uma obra que pode ser dividida assim: POESIA LÍRICA: em que o amor e o destino do homem são temas constantes; POESIA ÉPICA: em que recria a história do povo português na epopeia Os Lusíadas; TEATRO: escreveu à maneira medieval (Auto de Filodemo) e à maneira clássica (Anfitriões). Considerado um dos maiores escritores da língua portuguesa, Luís Vaz de Camões morreu na miséria.
* * *
Certamente, todos nós lemos, ou pelo menos, já ouvimos falar do livro Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes (1547-1616), escritor, dramaturgo e poeta espanhol. Nascido em Alcalá de Henares e considerado o principal nome da Literatura Espanhola; através de Dom Quixote, uma sátira às novelas de cavalaria, Cervantes tornou-se o precursor do realismo na Espanha. A partir de 1569, serviu como soldado na Itália, lutando contra os turcos na batalha de Lepanto (1571), ferindo-se no peito e na mão, adquirindo uma deficiência perdendo os movimentos da mesma, ficando esta inutilizada e, depois, amputada. Em 1575, participou da expedição contra Lúnis. Alistou-se nas forças do almirante espanhol Marquês de Santa Cruz, que derrotou a esquadra francesa organizada para defender a independência de Portugal. Durante essa sua jornada heróica, Cervantes chegou a ser preso por um caseiro árabe, passando cinco longos anos em cativeiro.
Após residir em Lisboa, retornou à Espanha em 1587, casando-se com Catalina Palacios de Salazar e iniciando sua vida literária. Escreveu cerca de 30 peças para teatro e o seu primeiro livro intitulado Galatéia. Mas, sem êxito na literatura, passou a trabalhar como coletor de impostos. Continuando a escrever, suas lembranças heroicas influenciaram-no, sem dúvida, para que produzisse a maior obra da literatura espanhola, sendo que o sucesso chegou com Dom Quixote de la Mancha (1603), contando as aventuras e desventuras de um fidalgo, o personagem-titulo e seu criado. Dividido entre a ilusão e a realidade, Dom quixote até hoje é considerado o símbolo do espírito idealista e aventureiro de ser humano. Já Sancho Pança é o arquétipo do lado realista e do Bom senso. Cervantes escreveu ainda Novelas Exemplares (1613), uma série de 12 pequenas histórias.
Em 1614 apareceu uma continuação apócrifa (autenticidade suspeita, duvidosa) da novela, em cujo prólogo o seu desconhecido autor descreve Cervantes como velho manco. Mas a segunda parte autêntica de Dom Quixote foi publicada no ano seguinte, onde no prefácio, Cervantes renuncia à vingança, mas reivindica tanto a sua velhice como a sua deficiência com palavras que são exemplo de informação intencionada:
"O que eu não pude deixar de lamentar é que me chame de velho manco, como se tivesse estado na minha mão fazer parar o tempo, que não passasse por mim, ou como se o meu aleijamento tivesse nascido em alguma taberna, e não na mais alta ocasião que viram os séculos passados, os presentes, e nem esperam ver os vindouros. Se minhas feridas não resplandecem nos olhos de quem olha, são estimadas, pelo menos, na estima dos que sabem ou onde se receberam; que o soldado mais parece morto na batalha que livre na fuga; e é isto em mim de maneira, que se agora me propusessem ou facilitassem um impossível, antes queria ter-me achado naquela ação prodigiosa, que são agora das minhas feridas sem me ter achado nela. As que o soldado mostra no rosto e no peito, estrelas são que guiam os outros ao céu da hora e ao desejar o justo elogio; e é preciso advertir que não se escreve com as cãs, mas sim com o entendimento, que costuma melhorar com os anos"
Os últimos dias de sua vida foram passados em Madri, em grande atividade literária.
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Silva (1987) também nos apresenta outros fragmentos de autores (científicos e literários), portadores de cegueiras:
* Nicolas Saundersobn (1682 a 1739), apesar da cegueira, chegou a inventar uma prancheta de calcular e publicou várias obras, dentre as quais destacamos "Elementos de Álgebra". O primeiro volume desta obra expõe um método que ficou conhecido como "aritmética palpável" e que permite ao usuário fazer todas as operações de aritmética com o uso do tato. Saundersobn tornou-se professor brilhante na Universidade de Cambridge e foi um dos grandes expositores das teorias de Newton, dedicando-se de um modo especial às teorias da luz e das cores.
* Leonhard Euler (1707 a 1783) foi um geómetra suíço que perdeu a visão aos 58 anos de idade. Adaptou-se bem à nova situação e prosseguiu com extremo afinco em suas atividades científicas. Escreveu "Elementos de Álgebra" e três volumes sobre dióptrica, que é parte da física que estuda a luz de acordo com os elementos que atravessa. A Academia de Ciências de París chegou a premiar várias de suas obras.
* Thomas Blacklock (1721 a 1791) perdeu a visão aos 6 anos de idade devido ao sarampo. Desenvolveu muito bem seus estudos e chegou a se formar na Universidade de Edinbourgh. Tornou-se ministro evangélico em 1759 e destacou-se nas letras como um dos melhores poetas escoceses. É conhecido como "O Poeta Cego". Redigiu diversos tratados de teologia e foi colaborador da Enciclopédia Britânica, escrevendo um artigo sobre cegueira. Escreveu também: "Consolações Tiradas da Religião e Revelada", o poema épico "Graham" e "Observações sobre a Liberdade". Thomas Blacklock deu também apoio a poetas mais jovens, sendo Robert Burus o exemplo mais marcante.
* Jacques Nicolas Augustin Thierry (1795 a 1856) foi um grande renovador de ciência histórica francesa e autor de "Narrativas dos Tempos Merovingios", "Considerações sobre a História da França" e "Ensaio sobre o Terceiro Estado".
* William Hickling Prescott (1796 a 1859), historiador inglês, autor de "História do Reino de Fernando e Isabel" e "Conquista do México".
* Henry Fawett (1833 a 1884), economista e político inglês, autor de "Manual de Economia Política" e catedrático na Universidade de Cambridge. Foi casado com a famosa Millicent Garrett.
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Um outro exemplo é Alexandre Pope. Londrino, nascido no ano de 1688, filho de pais católicos e bastante idosos. Considerado por todos que o conheceram um poeta nato, dentre suas obras originais destacam-se "Pastorais", a "Floresta de Windsor", o "Tratado sobre a Crítica", o "Tratado sobre o Homem". Pope também foi tradutor do poema lírico "Ilíada" e de "Odisséia", ambas obras de Homero. Sendo o mais famoso poeta de seu tempo na Inglaterra, tendo mostrado forte predileção pela crítica mordaz, com a qual agredia seus desafetos, dando vazão à sua agressividade. Portador de sérias limitações físicas desde o nascimento, o poeta sofrera severamente com raquitismo, mal que lhe deixou corcunda, com acentuada curvatura da espinha dorsal. Segundo Silva (1987), "a parte da frente da caixa torácica também era deformada e um dos lados do corpo era afetado por uma forte contração. Pope morreu em 1744, após uma contínua e heróica luta contra doenças e dificuldades causadas por sua deficiências físicas. Sua vitória maior está retratada em sua poesia. E foi exatamente esse produto de sua inteligência, criatividade e sentimentos que lhe garantiram um morredouro lugar na literatura inglesa, sendo o representante principal de seu classicismo".
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O poeta e satirista inglês George Gordon (1788 a 1824), é uma outra citação. Considerado até hoje um "herói nacional grego" - de um lado era profundamente melancólico, mas por outro fora um homem repleto de aspirações políticas -, foi Barão e o sexto Lord Byron, tendo uma vida cativando a imaginação de toda a Europa. Por ter nascido com um pé torto, sempre sofreu as consequências dessa deficiência. A exemplo de Camões, George Gordon era tratado como "garoto aleijado" por uma jovem da qual estava enamorado. Só que ao contrário de seu colega poeta, ele alimentou a sua mágoa com poemas de profunda tristeza, muitas vezes relacionadas a amores inatingíveis. Além das atividades poéticas, Gordon dedicou muito do seu tempo e fortuna à causa de libertação da Grécia, onde morreu.
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Outro célebre com deficiência física foi poeta inglês Barão George Gordon Byron (1788-1824). Em 1798, herdou o baronato e a mansão ancestral em Nottinhamshire, a abadia de Newstead. Seu primeiro livro de poemas, "Horas de Lazer", publicado em 1807, foi atacado pela Revista de Edimburgo; Byron contra-atacou com a sátira "Poetas Ingleses e Críticos Escoceses" (1809). As viagens pela Espanha, Malta, Albânia e Grécia (entre 1809 e 1811) forneceram material para "A Peregrinação de Childe Harold" (1812/18), que apresenta o peregrino como o típico herói de Byron, arredio, cínico e rebelde. Quando publicou seus dois primeiros cantos foi tripudiado pelos círculos literários e aristocráticos. Viveu por algum tempo em Genebra, com os Shelley e com Claire Clairmont (que lhe deu uma filha, Allegra, em 1817), e onde, em 1816, escreveu "O Prisioneiro de Chillon" e o drama poético "Manfred" (1817), fixando-se, finalmente, na Itália. Em Veneza, escreveu o poema satírico "Beppo" (1818), no qual encontrou um novo estilo coloquial irônico, desenvolvido plenamente em "Don Juan" (1819/24), uma sátira épica bastante refinada e irônica, muito admirada por Goethe. Embora condenada sob o ponto de vista da moral, a obra de Byron exerceu grande influência na poesia, música, romance, ópera e pintura do romantismo inglês e europeu.
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Indicado como uma das mais importantes figuras literárias nascidas em Portugal, Antônio Feliciano de Castilho (1800 a 1875), foi poeta, proseador, ensaísta, escritor e pedagogo. Por motivos desconhecidos, perdeu a visão aos 6 anos de idade. Nessa época o seu irmão Augusto, ao perceber a sua incrível memória, ajudou-o a estudar e a inteirar-se do mundo que o cercava. Quase no fim de seu curso em Coimbra, em 1821, publicou o seu primeiro trabalho de verdadeira importância intitulado "Cartas do Eco e Narciso". "Com a publicação de seu livro de poesias ‘O Outono’, após uma viagem ao Brasil e seus anos em Açores, despertou nos meios literários lusitanos uma violenta e polêmica que ficou conhecida como ‘Questão Coimbra’. Nela estiveram envolvidos nomes famosos, como Antero de Quental, Camilo Castelo Branco e outros. A cegueira não impediu Antônio Feliciano de Castilho de se transformar num dos mais respeitados nomes de toda a literatura portuguesa".
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Ainda dentro da literatura portuguesa, vamos encontrar Camilo Castelo Branco, que, não suportando a aquisição de uma deficiência visual que lhe impedia de continuar exercendo sua carreira literária, chegou a pôr fim em sua própria vida.
Filho de um pequeno fidalgo de nome Manuel Botelho e de uma mulher do povo,
Jacinta Rosa, nasceu em Lisboa em 1825. Órfão de mãe aos dois anos e de pai aos dez, iniciou uma vida verdadeiramente romancesca, ao ser então mandado para Trás-os-Montes, para casa de uma tia. A primeira instrução literária recebeu-a de um padre. Mais tarde, com o intuito de seguir Medicina, foi estudar para o Porto e para Coimbra. Porém, não concluiu nem Medicina, nem Direito ou Teologia, cursos que fez menção de tirar, alternadamente.
Casado aos dezesseis anos (e viúvo aos vinte), iniciou uma movimentada vida de amores intensos e difíceis, entremeados de raptos e fugas, que por mais de uma vez lhe valeram a prisão e o tribunal. Foi este caso do seu amor com Ana Plácido, em companhia de quem terminou a vida, em São Miguel de Ceide, suicidando-se devido a mil dificuldades familiares, monetárias e, até físicas, uma vez que estava praticamente cego e impossibilitado de escrever para sustentar os seus.
Nos romances de Camilo Castelo Branco, desfila todo o cortejo das paixões humanas. Tipos, caracteres, costumes, principalmente do norte de Portugal, aparecem nas suas páginas, desenhadas e descritas, com relevo magistral. De todos os escritores portugueses, nenhum foi mais fecundo que este, pois o número das suas obras é superior a 200.
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Nascida a 27 de junho de 1880, em Tuscúmbia, Alabama, Helen Keller, em consequência de uma enfermidade, uma terrível febre que quase a levou a óbito, ficou cega, surda e muda dois anos depois. Filha de um editor de jornal, seus pais, procurando melhorar a situação da filha, conseguiram, com a ajuda do Instituto Perkins Para Cego, de Boston, uma pessoa para ajudá-la a desvendar os seus e os mistérios do mundo. Assim, em 1887, duas forças se uniram: a mestra Anne Sullivan (ex-aluna do Perkins e que recuperou parcialmente a visão após algumas cirurgias) e a discípula Helen Keller.
A mestra despertou em Hellen suas possibilidades de escrever. Alfabetizada em 1890 e aprendendo a ler e escrever pelo sistema em Braille, teve uma vida escolar exemplar, chegando a se formar na universidade, onde vários dos materiais didáticos eram traduzidos para esse sistema. Graduou-se com honras na faculdade de Radcliffe em 1904.
Tornou-se uma escritora de sucesso, abordando em suas obras os problemas da cegueira, da surdez, questões sociais, direitos femininos, sempre lutando pela causa dos trabalhadores e pela igualdade das minorias. Resultado de toda essa dedicação foram os inúmeros prêmios internacionais em reconhecimento por sua obra de impacto em favor dos cegos. Ainda no tempo de faculdade, escreveu a sua principal obra, `A história de minha vida`, a qual teve um sucesso imediato, dando-lhe dinheiro para comprar uma casa.
Helen Keller faleceu em 01 de junho de 1968, aos 88 anos de idade.
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O nome mais expressivo da literatura argentina também se viu com problemas de cegueira quase no final de sua vida. Jorge Luís Borges, nascido em Bueno Aires, em 1899, é considerado o mais conhecido escritor, poeta e ensaísta argentino, sendo traduzido em numerosos idiomas. Situando-se deliberadamente à margem das preocupações sociais comuns à maioria dos escritores latino-americanos, Borges conheceu profundamente a cabala, as literaturas anglo-saxãs, germânicas e escandinavas, tendo especial predileção pelos autores esquecidos e apócrifos.
Dono de uma capacidade intelectual extraordinária, alimentada por muita leitura filosófica, teológica e pela literatura de várias culturas e épocas, sua genialidade ficou demonstrada nos seus ensaios publicados sob o título de Inquisiciones (1925), Discussões (1932) e outras coletâneas. As obras mais conhecidas de histórias fantásticas, Ficções (1944) e o Aleph (1949), revelaram pela primeira vez seu mundo intelectual, com linguagem própria, sistema de símbolos, e lhe dão fama internacional.
Depois disso, continuou a escrever, apesar do início da cegueira, que o obrigou a abandonar os textos longos e a ditar trabalhos curtos.
Seus temas preferidos foram os labirintos, os espelhos, a circularidade o tempo e a dualidade da natureza humana. A clareza do seu pensamento e sua capacidade de minar as suposições fundamentais do homem é marcante em sua obra.
Fundou e dirigiu algumas revistas literárias. Autor de uma vastíssima obra no campo da prosa, como poeta foi vanguardista, exaltando os aspectos cosmopolita e, igualmente, os suburbanos da capital argentina. Borges obteve fama internacional, sobretudo, com seus volumes de contos fantásticos. Também escreveu inúmeros livros ensaios críticos.
Jorge Luís Borges é provavelmente, o intelectual e a figura da literatura mais influente da América Latina. Labirintos (1962) é uma antologia de alguns de seus trabalhos mais conhecidos. Falecido em Genebra, Suíça, 1986, sua obra testemunha a tentativa do autor de negar o tempo através da própria escrita.
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Finalmente, passando pelo o Brasil, vamos descobrir dois fatos no mínimo curiosos da nossa Literatura Brasileira. Um dos principais poetas do romantismo brasileiro também se viu às voltas com uma deficiência no final de sua vida. Antônio de Castro Alves nasceu em 1847 e faleceu em 1871, na Bahia. Considerado o último grande poeta daquela fase literária, estudou Direito em Salvador e depois em São Paulo. Ficando conhecido como o poeta da liberdade, desigualdades sociais, lutando sempre a favor dos oprimidos, a sua denúncia da problemática da escravidão fez com que Castro Alves fosse denominado "O Poeta das Escravos", ficando conhecido com a frase "A praça é do povo, como o céu é do condor".
Após a separação de seu grande amor, a atriz Eugênia Câmara, ficou desgostoso, abatido, procurando refúgio em algumas distrações. Foi quando, em um dia de novembro de 1868, numa caçada no bairro de Brás, em São Paulo, sem querer, Castro Alves ao transpor uma vala, acionou o gatilho de sua espingarda, cravando uma bala no seu pé esquerdo. Nunca se curou de todo, pois a ferida do pé acrescentaram problemas infecciosos e pulmonares, uma vez que já sofria de tuberculose. Passando seis meses no leito de sofrimento, em maio de 1869, deixou São Paulo e foi para o Rio de Janeiro se tratar. Os médicos concluíram que a única alternativa seria a amputação do terço inferior da perna, tendo o poeta concordado. A mesma teve que ser feita sem anestesia, pois tais elementos químicos poderiam ser prejudiciais a tuberculose. Amputado, Castro Alves passou o resto de seus dias tendo que utilizar muletas para se locomover.
Além de sua poesia de caráter social, integram a obra do poeta baiano poemas lírico-amorosos, tendo uma visão mais realista e sensual do amor e da mulher. Dentre suas obras destacam-se: Poesia: Espumas flutuantes (1870); A cachoeira de Paulo Afonso (1876); Os escravos (1883) e o drama histórico Gonzaga ou a Revolução de Minas (1875).

Castro Alves morreu aos vinte e quatro anos, após uma vivência boêmia.
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Embora muito pouco divulgado, o maior escritor de todos os tempos, Machado de Assis, também tinha deficiência. Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908), nasceu no Morro do Livramento, Rio de Janeiro, filho de um pintor mulato e de uma lavadeira açoiana. Órfão de mãe muito cedo, foi criado pela madrasta, Maria Inês. Já na infância apareceram sintomas de sua frágil compleição nervosa, a epilepsia e a gaguez, que o acometiam a espaços durante toda a vida e lhe deram um feitio de ser reservado e tímido (Bosi, 1997).
Tentava esconder suas crises de epilepsia, pois, tal enfermidade segundo Azevedo (1992), era o repúdio que certamente ocorrera por parte daquela sociedade conservadora, cultivadora de mitos. Diz o autor:
"Mesmo nos dias atuais, a epilepsia ainda assusta leigos, e estigmatiza seus portadores. O preconceito e a desinformação são os responsáveis por tais reações. Se no século vinte ainda existe a concepção errônea de que a epilepsia é contagiosa, imaginamos no tempo do nosso Machado de Assis.
(...) No momento em que casara a instabilidade da vida, pelo casamento, pelo emprego público, pela fixação da carreira, no momento em que surgem os primeiros sintomas de consideração literária, e em que se começa a se integrar na sociedade: quando vai procurando forrar-se da circunspecção e da `amável formalidade` com que pretende domesticar a sociedade para dominá-la e vencê-la, é que surge a doença infamante e humilhante, que anula a personalidade e faz desaparecer a respeitabilidade(...)."
Sabe-se através de relato de sua esposa Carolina, que dois anos após o matrimônio, Machado de Assis teve a primeira crise por volta de 1871/72. Referente a querer esconder o que ele mesmo chamava de `mal sagrado`, Azevedo (1992) esclarece que `o fato é que, com a convicção de sua miséria orgânica, que acrescentava às entidades preocupações de inferioridade racial e social, Machado julgou-se um desgraçado`:
"(...) Desde pequeno sofrera, órfão, desprotegido da sorte, mestiço, feio e gago. Sentira logo que não eram para ele as ilusões da mocidade, e compreendeu cedo que tinha de dominar as reservas de temperamento e a timidez, se quisesse conseguir um lugar ao sol. Os sofrimentos desse período de primeiro contato, sem o necessário preparo, com a vida, diante de suas resistências naturais, já lhe haviam provido de certa capacidade de sentir as injustiças e as maldades do mundo. (Azevedo, 1992)"
Dentre a sua vasta obra destacam-se Memórias Póstumas de Brás Cuba (1881 -romance marco do realismo brasileiro) e Contos Fluminenses (1870).
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Outro escritor brasileiro que merece ser destacado é José Espínola Veiga, com deficiência visual total, nascido na Zona Norte do Rio de Janeiro em 21 de dezembro de 1906. Aos 5 anos foi estudar no colégio do professor Mamede Freire, o qual também era cego, mas dirigia um colégio de pessoas com visão normal. Lá, Veiga começou a ler pelo Sistema Braille e, aos oito anos, foi matriculado no Instituto Benjamin Constant, já sabendo ler e fazer as quatro operações. Na época, era o aluno mais novo do dessa primeira escola brasileira só para cegos fundada ainda no tempo do Brasil Império.
No IBC, em 1927, terminou o curso e procurou se aperfeiçoar em línguas: francês e inglês. No ano seguinte, ingressou no magistério, lecionando as duas línguas, porém, por conveniência do instituto, ficou como professor de inglês.
Sempre muito ativo, em 1936 fundou, no Méier, um colégio para alunos com visão normal fazerem prova de ingresso no Serviço Público e outros empregos em geral (Liceu Popular). Dois anos depois, orientava a fundação do Instituto de Cegos da Bahia e, mais tarde, o Instituto de Cegos de Novo Horizonte, em São Paulo.
Decorria 1942, quando montou um Centro de Aprendizado de Línguas, instalando aparelhagem com discos gravados por leitores na língua de origem, fazendo vir do exterior textos para o aluno acompanhar a leitura.
Passados mais dois anos e sempre muito ativo, Veiga conseguiu os primeiros empregos para cegos no Serviço Público, demonstrando que o cego podia fazer curso superior. Nesse mesmo ano, encaminhou as primeiras crianças cegas à escola comum, na Escola Minas Gerais, além de criar a primeira Revista para Cegos do Brasil.
De volta à velha escola, em 1945, realizou modificações na mesa telefônica do IBC, 'Telefone Musical", para provar que o cego podia ser telefonista. Mais tarde, por essa iniciativa do Prof. Veiga, outros melhoramentos foram surgindo, e hoje muitos cegos trabalham como telefonistas no Brasil.
Tempos depois, eram reabertas no IBC, as oficinas tipográficas e de encadernação, que passaram a funcionar sob a denominação de Seção Braille, subordinada à Seção de Educação, dirigida, então, pelo professor José Espínola Veiga. Não perdendo tempo, ele propôs ao diretor João Alfredo Lopes Braga, não só a desvinculação entre as duas Seções, mas, também, a construção de uma novo prédio para a Imprensa Braille, concluído somente nos meados de 1945, dando-se a mudança no dia 26 de junho. No entanto, por não haver ainda água e luz no prédio, as atividades só puderam ser reiniciadas no segundo dia de janeiro do ano seguinte.
Fundou, em 1951, um colégio para alunos com visão normal que ele denominou de Curso Mauá, em Cascadura, Rio de Janeiro, organizando em seguida, no IBC o 1º Curso de Aperfeiçoamento de Professores para Cegos; demonstrou que o cego podia votar.
José Espínola Veiga foi empresário de som, representando no Brasil os melhores equipamentos da Europa, fazendo cinco viagens ao exterior, sempre visitando as organizações de cegos e trazendo de lá tudo que pudesse melhorar a sorte dos companheiros cegos.
Teve uma vida intelectual também intensa. Escreveu sobre educação de cegos em vários jornais do Rio de Janeiro. Membro da Academia Petropolitana de Educação, é autor de dois livros publicados pela José Olímpio Editora: "A vida de quem não vê" e "O que é ser cego", além de ser o tradutor de duas obras de Helen Keller: "História de minha vida" e "Minha vida de mulher".
Faleceu de insuficiência respiratória no dia 5 de fevereiro de 1998 na Beneficência Portuguesa, no Rio de Janeiro.
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Dentro da cultura nordestina do Cordel, também encontraremos um personagem fascinante: Aderaldo Ferreira de Araújo, conhecido popularmente por Cego Aderaldo. Nasceu no dia 24 de junho de 1878 na cidade do Crato, Ceará, mas poucos dias após sua família mudou-se para Quixadá, no mesmo estado. Aos cinco anos começou a trabalhar, pois seu pai, um alfaiate, adoeceu e não conseguia sustentar a família. Perdeu um irmão cedo de doença e o outro foi tentar a vida no Amazonas e nunca mais voltou. Tomou conta dos pais sozinho. Seu pai morreu em 25 de março de 1896. Quinze dias depois dessa morte, aos 18 anos, Aderaldo trabalhava como maquinista na Estrada de Ferro de Baturité, quando sua visão se foi depois de uma forte dor nos olhos. Pobre, cego e sem ter a quem recorrer, tempos depois teve um sonho em verso, ocasião em que descobriu seu dom para cantar e improvisar. Ganhou uma viola a qual aprendeu a tocar. Mais tarde começou a tocar rabeca. Algum tempo depois, quando tudo parecia estar voltando à estabilidade, sua mãe morre. Sozinho, começou a andar pelo sertão cantando e recebendo por isso. Percorreu todo o Ceará, partes do Piauí e Pernambuco. Com o tempo sua fama foi aumentando. Em 1914 se deu a famosa peleja com Zé Pretinho (maior cantador do Piauí), um fato histórico no Nordeste. Depois disso voltou para Quixadá, mas, com a seca de 1915, resolveu tentar a vida no Pará. Novamente em Quixadá por volta de 1920, permaneceu ali até 1923, quando resolveu conhecer o Padre Cícero. Rumou para Juazeiro onde o próprio padre veio receber o trovador que já tinha fama. Algum tempo depois foi a vez de cantar para Lampião, que satisfez seu pedido - feito em versos - de ter um revólver do cangaceiro.
Cego Aderaldo sempre procurava novas alternativas de sobrevivência. Tentando mudar o estilo de vida de cantador, em 1931, comprou um gramofone e alguns discos que usava para divertir o povo do sertão apresentando aquilo que ainda era novidade mesmo na capital. Conseguiu o que queria, mas o povo ainda o queria escutar. Logo depois, em 1933, teve a ideia de apresentar vídeos, que também deu certo, mas não o realizava tanto. Resolveu se estabelecer em Fortaleza em 1942, onde veio a abrir uma bodega na Rua da Bomba, No. 2. Infelizmente o seu traquejo de trovador não servia para o comércio e depois de algum tempo fechou a bodega com um prejuízo considerável.
Desde 1945, então com 67 anos, Cego Aderaldo parou de aceitar desafios. Mas também, já tinha rodado o sertão inúmeras vezes, conseguira ser reconhecido em todo lugar, cantara pra muitas pessoas, inclusive muitas importantes, tivera pelejas com os maiores cantadores (o episódio com Zé Pretinho). E, na medida em que a serenidade, que só o tempo trás ao homem, começou a dificultar as disputas de peleja, ele resolveu passar a cantar apenas para entreter a alma. Cego Aderaldo nunca se casou e diz nunca ter tido vontade, mas costumava ter uma vida de chefe de família pois, criou 24 meninos.
O assunto literatura de cordel será novamente focado no próximo ensaio...
Referência Bibliográficas:
 
AZEVEDO, D.J. de. `Machado da Assis - Epiléptico`. São Paulo; D.O. Leitura, nº 124, setembro de 1992.

BOSI, A. História concisa da literatura brasileira. São Paulo; Cultrix, 1997. 35ª. Edi.

SILVA, O.M. A epopéia ignorada. A pessoa deficiente na história de ontem e de hoje. São Paulo: CEDAS, 1987.