Izabel Maior e Fábio Meirelles.
O tema da igualdade de oportunidades e não
discriminação das pessoas com deficiência está surgindo cada vez com mais
ressonância nos debates políticos, dentro e fora do movimento social, no âmbito
dos poderes executivo, legislativo e judiciário, nas agremiações partidárias,
nos sindicatos patronais e de trabalhadores.
Não foi assim por muito tempo, pois a
invisibilidade desse grande contingente de pessoas se perpetuava nos discursos
superficiais e que se aproximavam do obsoleto paradigma do assistencialismo e
do modelo que reduz as ações da política pública ao setor saúde em se tratando
de pessoas com deficiência.
Confundidas com permanentes ‘pacientes’, passivos,
sem voz, sem autonomia e sem direitos, cada pessoa vivia a sua história de
discriminação e preconceito de forma isolada, sem saber que era tão titular de
direitos e de deveres como todo e qualquer cidadão. Na virada de 1979 para os
anos 1980, nasce no país a consciência de movimento político das pessoas com
deficiência.
O processo ganha fôlego com a adoção do Ano
Internacional da Pessoa Deficiente, instituído pela ONU e celebrado nos países
do ocidente, entre eles o Brasil, em 1981. A luta cresce e ganha mais espaço
entre as reivindicações sociais, ainda de forma incipiente, sem organização e
representatividade próprias, sem força de protagonistas, mas com uma imensa
capacidade de dizer não à tutela e ao paternalismo.
Não se conseguem programas, ações e orçamento
públicos sem críticas e sem demandas políticas. É sabido que a crítica que tem
legitimidade vem da sociedade organizada em movimentos chamados de ‘minorias
marginalizadas’. A partir deles surgem democraticamente as demandas reais, que
reclamam, mas que no futuro não se olvidam dos avanços conquistados com
programas e investimentos sérios e efetivos tanto no campo normativo como na
praxe inovadora.
Nessa direção, a ampliação da participação surge
recentemente como ‘novo sentido da democracia’. Protestos e movimentos
articulados pautam novas formas e mecanismos de democratização da gestão e do
processo decisório.
Definições
de Democracia.
As 37 formas de democracia listadas na Wikipédia
são basicamente variações sobre o mesmo tema: eleitores votam diretamente nas
questões que lhes interessam, como na Grécia, ou votam em representantes que
vão administrar e decidir por eles, como no Brasil.
Nessa perspectiva, a distinção mais importante
acontece entre democracia direta (algumas vezes chamada ‘democracia pura’),
onde o povo expressa a sua vontade por voto direto em cada assunto particular,
e a democracia representativa (algumas vezes chamada ‘democracia indireta’),
onde o povo expressa sua vontade através da eleição de representantes que tomam
decisões em nome daqueles que os elegeram.
Ainda para a Wikipédia, democracia seria um regime
de governo onde o poder de tomar importantes decisões políticas está com os
cidadãos (povo), direta ou indiretamente, por meio de representantes eleitos -
forma mais usual. Uma democracia pode existir num sistema presidencialista ou
parlamentarista, republicano ou monárquico. A democracia se oporia ‘à ditadura
e ao totalitarismo, onde o poder reside numa elite auto-eleita’.
Ampliação
das Formas de Participação.
Ampliação dos horizontes da democracia, reflexões
sobre multiculturalismo, exercício diário da cidadania: esses e outros temas
ganham visibilidade. Cria-se um ambiente de efervescência participativa; a
urgência e necessidade de novas dinâmicas e caminhos aparecem como angústia. Se
faz necessário oxigenar e dar qualidade ao exercício da democracia.
Nesse novo processo, quer-se participar das
decisões; quer-se formular, fiscalizar, acompanhar a execução; quer-se decidir
sobre conteúdo e valores de orçamento. Surgem dinâmicas formais e informais:
grupos, movimentos, fóruns. Propõe-se uma governança democrática de gestão.
A cultura participativa torna-se importante para a
formação de sujeitos ativos, inventivos, capazes de mover a sociedade para
alternativas sócio-políticas inovadoras. A cultura participativa pode ainda
assegurar a continuidade de projetos significativos para a sociedade, a
moralização da coisa pública, a gestão transparente e ética, a formação de
comunidades vigilantes dos direitos conquistados; além disso, assume papel
fundamental para o enraizamento e valorização do sentimento de pertencimento à
localidade.
Audiências públicas, criação de conselhos de
política, conselhos temáticos, realização de conferências: a partir da década
de 1980 são criados canais que ampliam a participação dos cidadãos. No Brasil,
a Constituição de 1988 traz inovações institucionais: referendos, plebiscitos,
iniciativas populares de lei, várias propostas e variáveis expandem o escopo da
soberania popular.
Esses canais de participação têm, entre seus
objetivos, descentralizar o poder de definição dos eixos da política pública,
estabelecer um processo democrático e transparente de governança, estimular a
auto-organização social e discutir orçamento/uso do dinheiro público junto à
população.
Cenário
Ideal.
Num cenário ideal participativo, os cidadãos se
tornariam agentes multiplicadores da governança democrática; conselheiros
buscariam formação para adquirir capacidades técnicas para entender os
mecanismos burocráticos da gestão pública, para definir propostas e ações e
reforçar a autonomia dos movimentos sociais. Esses mecanismos institucionais de
participação devem descentralizar suas ações nos territórios e dar capilaridade
às políticas, convergindo para uma atuação integrada.
Para esse cenário participativo, os órgãos de
gestão das políticas públicas devem ser dinâmicos para impulsioná-las; a
cultura administrativa e operacional deve permitir a liberdade de debate e
diferença de opiniões; os gestores devem romper com a política do ‘medo’ à
democracia, romper com a centralização em órgãos e pessoas. A ‘máquina’ deve
estar preparada ou ter disponibilidade para uma ação compartilhada com atores,
parceiros e mercados diferenciados. Deve-se dar lugar a um tempo cada vez mais
dinâmico, ágil e criativo.
É necessário articular o local, o nacional e o
global, combatendo paradigmas estáticos e fechados de governança. O local é o
terreno fundamental da vitalidade participativa, mas nunca se pode esquecer que
bairros, municípios e estados estão inseridos num planeta com seus desafios
essenciais para os países e regiões.
A teoria participativa, que avança numa governança
democrática, deve buscar sempre a ampliação do direito à cidadania, deve sempre
buscar a mudança na estrutura de produção, deve humanizar as relações e os
processos, deve estimular a criatividade política, a tecnologia, a indústria, o
comércio, a educação, as artes e o desenvolvimento social e comunitário.
Deve-se sempre buscar o controle da gestão pública, deve-se avaliar as ações,
deve-se reconhecer as diferenças entre pessoas e grupos. Estabelecer ética na
política e transformar o cidadão em protagonista.
Participação
Social no Tema Pessoas com Deficiência.
As conferências nacionais foram instituídas para
introduzir na política pública social conteúdos originários do exercício da
democracia participativa - o dialogar direto entre governo e grupos sociais.
A I Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com
Deficiência, em 2006, aprofundou a divulgação e trabalhou sob o lema
‘Acessibilidade, você também tem compromisso’ e lançou a campanha
‘Acessibilidade - siga essa ideia’. A segunda edição da Conferência Nacional,
em 2008, escolheu o lema ‘Inclusão, Desenvolvimento e Participação: um novo
jeito de avançar’, quando foram debatidos a Agenda Social e o Compromisso pela
Inclusão das Pessoas com Deficiência, instrumento do pacto federativo em favor
da inserção social das pessoas com deficiência em regime de cooperação.
As conferências e os encontros nacionais de conselhos
realizados em 2003, 2004 e 2007 são parcerias do Conselho Nacional dos Direitos
da Pessoa com Deficiência - CONADE e da Subsecretaria Nacional de Promoção dos
Direitos da Pessoa com Deficiência, a anterior CORDE, ambos da estrutura da
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
A exemplo das conferências, as consultas públicas
feitas pelo governo federal também deram destaque ao protagonismo das pessoas
com deficiência, modificando a maneira de fazer decretos e normas, bem como de
elaborar programas e ações. Desse modo, as pessoas com deficiência são
co-autoras dos decretos federais: da acessibilidade (Decreto n° 5.296/2004), da
difusão da Língua Brasileira de Sinais – Libras (Decreto n° 5.626/2005) e do
uso de cão-guia (Decreto n° 5.904/2006).
Educação,
Trabalho/Emprego, Saúde e Assistência.
O Decreto n° 6.571 foi um marco no ano de 2008,
introduzindo o atendimento educacional especializado na perspectiva da educação
inclusiva, com financiamento federal para ações de acessibilidade nas escolas,
sala de recursos multifuncionais e capacitação de professores, entre outras
iniciativas.
O orçamento para a educação especial, a partir de
2003, foi triplicado, e o Ministério da Educação alcança investimentos em 2010
de quase R$150 milhões na implementação da Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva.
De 2007 a 2009 foi disponibilizado um total de
14.925 salas de recursos multifuncionais, foram adequados 12.596 prédios
escolares para a acessibilidade aos alunos com deficiência e foram formados
31.097 professores, com investimento de R$ 7,9 milhões.
Com relação à empregabilidade e inclusão de pessoas
com deficiência no mercado de trabalho, a reserva de cotas está em conformidade
com o dispositivo da Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com
Deficiência – Art. 27, item 1, alínea h: ‘Promover o emprego das pessoas com
deficiência no setor privado, mediante políticas e medidas apropriadas, que
poderão incluir programas de ação afirmativa, incentivos e outras medidas’. O
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) tem impulsionado ações estratégicas de
combate à discriminação no emprego e na ocupação, inserindo-se no esforço de
governo e sociedade para promover a cidadania com respeito aos direitos
fundamentais e à diversidade das relações humanas.
No período de 2005 a 2010 foram 112.709
trabalhadores com deficiência inseridos no mercado de trabalho mediante ação
fiscal. Além disso, o MTE procura as empresas que ainda não integralizaram a
cota legal, dando a alternativa de inserir aprendizes com deficiência, por um
período máximo de dois anos, quando então serão contratados como trabalhadores
definitivos. A Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2007 apresentava
um dado total de 111.644 aprendizes, sendo apenas 230 pessoas com deficiência;
dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), em março de
2010, totalizaram 174.514 aprendizes, sendo 1.036 aprendizes com deficiência,
um aumento substancial de 450% em três anos na contratação de aprendizes com
deficiência.
Já a Política Nacional de Saúde da Pessoa com
Deficiência foi instituída pela Portaria MS/GM nº 1.060, de 5 de junho de 2002,
tendo como principais objetivos a atenção e a reabilitação da pessoa com
deficiência no Sistema Único de Saúde (SUS). A constituição das Redes de
Serviços de Reabilitação tem sido ação prioritária do Ministério da Saúde,
seguindo as diretrizes de descentralização, co-gestão, e financiamento
compartilhado. As pessoas com deficiência são público do Programa de Saúde da Família
e agentes comunitários de saúde, além de serem atendidas nas redes de maior
complexidade.
A produção total de procedimentos dos mais de 1.300
Serviços de Reabilitação (física, auditiva, visual e intelectual), em 2009,
apresentou a frequência (com atendimento por equipe multiprofissional) de 17,4
milhões de procedimentos, com recursos da ordem de 334 milhões de reais. A
produção total quanto à concessão de órteses e próteses (ortopédicas,
auditivas, recursos ópticos e bolsas de ostomia), apresentou frequência de 3
milhões de procedimentos, no valor de 223 milhões de reais.
O Benefício de Prestação Continuada da Assistência
Social (BPC) assegurou, já em maio de 2010, uma renda mensal a 1.688.881
pessoas com deficiência e a 1.572.743 idosos, o que equivale a um montante de
R$ 8,19 bilhões repassados. Para além da contribuição do BPC na redução de 9%
do índice de desigualdade de renda no país, cabe destacar os avanços do
Programa BPC na Escola, instituído pela Portaria Interministerial
MDS/MEC/MS/SEDH nº 18, de 24 de abril de 2007, em sintonia com o do Programa de
Inclusão das Pessoas com Deficiência da Agenda Social do Governo Federal.
O Programa BPC na Escola possibilitou o engajamento
de 2.622 municípios brasileiros e do Distrito Federal em ações intersetoriais
para que aconteça a promoção do acesso e permanência na escola de 232 mil
beneficiários do BPC, na faixa etária até 18 anos, fortalecendo o
acompanhamento desses beneficiários, propiciando que sejam alcançáveis pelas
políticas públicas de assistência social, educação, saúde e direitos humanos.
Sensibilização:
Instrumento de Educação em Direitos Humanos.
A sociedade tem o poder de contribuir para o
alcance da inclusão, processo subversivo do paradigma de integração.
Entretanto, para que seu desempenho seja de facilitador da transformação, cabe
ao poder público realizar e veicular campanhas educativas. A então
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência -
CORDE, da Secretaria de Direitos Humanos, lançou e veiculou em 2009 e 2010, a
campanha ‘Iguais na Diferença, pela Inclusão das Pessoas com Deficiência’,
embalada pela música ‘Condição’, de Lulu Santos, no rádio, em revistas, na
televisão e, ineditamente, como publicidade de utilidade pública do governo
federal no Youtube.
Essa peça publicitária também inovou ao trazer os
recursos de acessibilidade à comunicação - legenda, janela com intérprete de
Libras (Língua Brasileira de Sinais, oficial desde 2002) e audiodescrição
(segundo canal de áudio com a narrativa das cenas). Esse vídeo foi premiado
(Menção Honrosa no Festival de Gramado de Publicidade 2009) e já se tornou um
poderoso instrumento de educação em direitos humanos e de demonstração prática
de acessibilidade.
Essas mudanças estão acontecendo devido ao aporte
de recursos orçamentários dos diversos ministérios, com participação importante
dos de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Educação, Saúde, Cidades,
Trabalho e Emprego, Ciência e Tecnologia, Esporte, Cultura e Turismo.
A lógica das ações integradas e transversais
potencializa resultados e impactos positivos para a vida das pessoas com
deficiência. É a caminhada real entre ter direitos e poder efetuá-los no
cotidiano, apesar da falta de muitas medidas necessárias para expandir as
oportunidades sem restrições de qualquer natureza.
Oportunidades
de Negócios, Produtos e Prestação de Informações das Ações Públicas
Governamentais.
As pessoas com deficiência no Brasil são eleitoras
politizadas e já demonstraram sua capacidade de exigir e consolidar direitos
humanos com foco nas especificidades que as tornam autônomas e independentes,
atuantes no mercado de trabalho e contribuintes do imposto de renda e outros
tributos que garantem o crescimento do país. Esse grupo também é consumidor de
tudo que há de trivial e sustenta o mercado de um conjunto de serviços e
produtos de tecnologia cada vez mais sofisticados e customizados.
A indústria nacional encara como oportunidades de
negócios o mercado consumidor formado pelas pessoas com deficiência auditiva,
visual, física, intelectual e múltipla. Para além de equipamentos de tratamento
de reabilitação, a onda de desenvolvimento chegou aos recursos educacionais e
aos usados no ambiente de trabalho, aos de informação e de comunicação, aos de
transportes coletivos e individuais, e também na moradia, cultura, turismo,
esporte, recreação e lazer.
Dados obtidos do balanço preliminar da IX Feira
Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade (REATECH),
a quarta maior feira mundial de equipamentos e serviços, em sua nona edição em
2010, realizada na cidade de São Paulo, mostram que R$ 1,5 bilhão movimentou a
economia, principalmente com compra e venda de cadeira de rodas, de veículos e
de adaptações. O resultado é ainda uma novidade a ser assimilada pelos
empresários, mas houve a participação de 230 expositores e a feira recebeu
cerca de 45 mil visitantes.
A REATECH também vem cumprindo o papel de vitrine
de prestação de contas dos governos à sociedade. Desde 2004, a Secretaria de
Direitos Humanos, sob a coordenação da área da política de promoção dos
direitos da pessoa com deficiência, organizou em seu estande: exposição,
distribuição de material, principalmente publicações sobre direitos e cidadania
e, com a presença dos parceiros, prestação de informações a respeito dos
programas federais existentes. A cada ano, é maior o número de ministérios e
órgãos associados que se fazem presentes. Também cursos, seminários e
lançamentos de livros foram realizados pelo governo federal aproveitando a
grande presença do público.
Perspectivas
para o Século XXI.
As especificidades de cada tipo de deficiência não
perdem de vista, em momento algum, a consciência de que a conquista de novos
avanços depende, sobretudo, da produção de um discurso agregador de todos os
tipos de deficiência, o que leva a identificar a força e o potencial
transformador do movimento. Nesse sentido, a Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e as Conferências Nacionais de Direitos das Pessoas com
Deficiência trouxeram um novo fôlego ao movimento.
A Convenção da ONU foi emblemática pela participação ativa de
organizações não governamentais na sua formulação, um importante resultado do
Cáucus Internacional sobre Deficiência, fórum de organizações não
governamentais que foram acreditadas junto à Organização das Nações Unidas, que
deu abertura à participação direta do público destinatário da Convenção de ter
voz e dialogar nas sessões paralelas com as representações oficiais. O lema
“Nada sobre nós sem nós” encontrou na elaboração do tratado de direitos humanos
do século XXI a sua expressão máxima, conferindo legitimidade ao texto.
Tratando do assunto no plano nacional, a conquista
da ratificação com equivalência constitucional da Convenção e de seu Protocolo
Facultativo, em 2008, trouxe para esse segmento a garantia do direito a ter
direitos humanos especificados para as suas necessidades. Altera-se o eixo das
intervenções de forma definitiva, pois são as barreiras interpostas entre a
pessoa e o ambiente que determinam a deficiência.
Cabe o desafio de adequar alguns dispositivos
legais internos, em especial alterar a valoração e certificação das situações
de deficiência que deixarão de ser categorizadas como hoje no Decreto n°
3.298/1999, para seguir o paradigma da capacidade funcional e de participação.
Em síntese, uma avaliação da possibilidade de interação da pessoa com o mundo,
com o exercício dos seus direitos e inerente dignidade.
Com a Convenção, aumentam as obrigações do Estado,
em todas as esferas de governo, bem como as obrigações do segundo e terceiro
setores, com ativa participação da pessoa com deficiência e das famílias. A
provisão de acessibilidade, no desenho universal e na tecnologia assistiva,
tornou-se fator constitucional e não pode ser postergado ou negado (Decreto
Legislativo n° 186/2008 e Decreto n° 6.949/2009).
A maior ênfase ao direito à acessibilidade é um
ganho extraordinário que reforça todo o trabalho iniciado com o Decreto
n°5.296/2004, já muito bem conhecido pelas pessoas com deficiência, entidades
de defesa de direitos, conselhos, órgãos de fiscalização como o Ministério
Público, na esfera da União e dos estados, dos órgãos gestores municipais que
respondem por mais de 70% do cumprimento dos critérios da acessibilidade senso
amplo.
O início do século XXI vem consagrando o discurso
dos direitos humanos e ultrapassa especificidades e particularidades, a
principal conquista do movimento nos últimos trinta anos, mesmo no plano
internacional. O foco das discussões é a forma como - e para quem - a sociedade
organiza o cotidiano, as cidades, a infraestrutura de saúde, educação, cultura,
proteção social, transporte, lazer, trabalho, esporte, etc.
O mundo atual permite que o movimento das pessoas
com deficiência avance em direção a novas bandeiras e conquistas. No final da
década de 1970, o importante era ser protagonista político na conquista e
garantia de seus direitos. Nessa luta, as pessoas com deficiência no Brasil
passaram pela redemocratização, pelo AIPD, pela Coalizão Pró-Federação, pela
Constituição de 1988, pela Convenção da ONU e sua ratificação pelo Brasil, por
encontros, congressos, reuniões, simpósios, atos públicos, conferências, etc.
O movimento encontra-se agora diante do desafio de
seus próximos passos: primeiro, garantir que os instrumentos legais até então
conquistados sejam implantados e implementados na vida cotidiana; segundo,
formar e fortalecer novas lideranças capazes de dirigir a continuidade da
história do movimento das pessoas com deficiência no Brasil, menos como grupo a
lutar por direitos e mais por pessoas que se distinguem do passado por serem
iguais na diferença e, portanto, iguais em cidadania.
Marco
Legal e Cidadania.
A Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos
da Pessoa com Deficiência sucedeu a Coordenadoria Nacional para Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE (Decreto n° 6.980, de 13/10/2009). Com
a estrutura maior e com o novo status, o órgão gestor federal de coordenação e
articulação das ações de promoção, defesa e garantia de direitos humanos desse
conjunto de 24,5 milhões de brasileiros tem mais alcance, interlocução e
capacidade de dar respostas às novas demandas do segmento.
A melhor ação para assegurar o cumprimento das
obrigações assumidas pelo Estado brasileiro ao ratificar a Convenção da ONU
chama-se capacitação e consequente fortalecimento das organizações do movimento
das pessoas com deficiência. Direitos humanos são inerentes à pessoa humana e
lhes conferem dignidade e igualdade. São, portanto, suprapartidários. Assim, ao
conhecer seus direitos, cada pessoa inicia o caminho certo e sem volta do
exercício do direito, exigindo cidadania sem distinção das demais pessoas no
Estado Democrático de Direito.
Referências
bibliográficas:
AVRITZER, Leonardo. A moralidade da democracia:
ensaios em teoria habermasiana e teoria democrática. Belo Horizonte: Ed. UFMG;
São Paulo: Ed. Perspectiva, 1996. Capítulo 5.
________. “Teoria democrática e deliberação pública”. Lua Nova, São Paulo, v
49: 25-46, 2000
________ e SANTOS, Boaventura de Sousa. Para ampliar o cânone democrático.
Disponível em www.eurozine.com.
COORDENADORIA NACIONAL PARA INTEGRAÇÃO DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA -
CORDE. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Comentada,
2008 MAIOR, Izabel Maria Madeira de Loureiro. Apresentação (In) A convenção
sobre Direitos das Pessoas com Deficiência Comentada. Coordenação de Ana Paula
Crosara Resende e Flavia Maria de Paiva Vital. Brasília, Secretaria Especial
dos Direitos Humanos, Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência, 2008.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS - ONU. Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência, 2006 ato2007.
SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na
pós-modernidade. São Paulo, Editora Cortez, 1997.
Isabel de Loureiro Maior (Brasília).
Médica fisiatra e docente-mestre da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, especialista em políticas públicas e gestão
governamental do Ministério do Planejamento;
ativista do movimento político das pessoas com deficiência desde 1977; foi
titular da Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com
Deficiência, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República,
sendo a primeira pessoa com deficiência à frente da antiga CORDE.
Fábio Meirelles (Brasília).
Jornalista, especialista em democracia participativa, república e movimentos
sociais, atuou como Coordenador na Coordenação Geral de Informação e
Comunicação sobre Deficiência da Subsecretaria Nacional de Promoção dos
Direitos da Pessoa com Deficiência, da Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República. É agente da Inclusão e oficineiro da Inclusão da
Escola de Gente – Comunicação em Inclusão.