Ally e Ryan

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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Estudar separado é crescer invisível, sem direitos e sem sentido

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Por Claudia Grabois*

É difícil compreender por que ainda hoje instituições relutam em ressignificar seu papel na sociedade, em razão e sensibilidade.

No dia 9 de julho deste ano [2009], comemoramos o primeiro aniversário da ratificação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que é um tratado revolucinário sobre acessibilidade e não discriminação, que estão presentes em todos os artigos do texto, o qual, por ter sido ratificado com quorum qualificado pelo Congresso Nacional, tem equivalência de Emenda Constitucional.

Meu principal papel na sociedade é ser mãe, e tenho filhos com e sem deficiência; e por desejar o melhor para as suas vidas, alimento o sonho de que vivam em uma sociedade mais igualitária e justa para todas as pessoas. Para todos e todas, porque como diz a canção, “é impossível ser feliz sozinho” , e impossível, inclusive viver em segurança, quando existem ainda milhões de brasileiros excluídos na sociedade, pessoas sem deficiência e pessoas com deficiência de todas as etnias, culturas e populações.

Sim, pessoas com deficiência perpassam todos os setores e segmentos da sociedade e fazem, ou deveriam fazer, parte da vida do país, mas não é o que acontece. Mas como ser sem nunca haver sido?

Pois bem, agora não há mais desculpas, estudar separado é crescer invisível, sem direitos, sem sentido; pois com a relação ”eu e tu” ameaçada em razão da não existência do outro, nada mais faz sentido.

Conhecer, aprender junto, pertencer, conviver, participar, ser visto como gente e se sentir gente não são palavras vazias, mas sim necessidades básicas do ser humano. Por isso mesmo que nossa Lei Maior trata do tema educação como direito inquestionável e indisponível, entendendo que se trata de gente; e, para ser gente, não há outra opção a não ser a de pertencer de fato e de direito.

Como mãe de quatro crianças, e uma delas com deficiência intelectual, aluna da rede municipal de ensino do Rio de Janeiro e que frequenta a sala de recursos multifuncionais no contraturno, posso assegurar que esse é o caminho para a construção da cidadania. Não apenas da minha filha, mas dos meus outros filhos e de todos os filhos deste país.

É claro que precisamos lutar muito para garantir um sistema de ensino adequado e de qualidade para alunos com e sem deficiência, mas muitos passos importantes já foram dados nesse sentido, e, como mãe, continuo a prestar atenção e a afirmar para outras mães, pais, tios e avós que precisamos trabalhar juntos, exercer o nosso direito, cumprir com o nosso dever e não ter dúvidas de que esse é o caminho.

Não há outra saída para a sociedade, pois a educação não é um fim, é apenas um meio e o começo de uma vida de inúmeras possibilidades, onde se aprende, além do português e da matemática, que a vida é para todos e todas e a sociedade um espaço para o exercício da cidania.

As pessoas com deficiência não podem mais viver segregadas e institucionalizadas. Quem aufere esse direito a quem tranca, prende e não permite opiniões? Quem tem o direito de dizer que uma criança não pode frequentar a escola de todas as outras crianças? Ninguém tem.

Os alunos com deficiência devem estudar na classe comum da escola regular e ser atendidos em suas especificidades dentro dela e, quanto ao AEE, que seja preferencialmente dentro da escola regular.

Nesse sentido, fico mesmo indignada, pois enquanto deveríamos aproveitar das diretrizes de uma Secretaria de Educação Especial (MEC) que cumpre a Lei promovendo e possibilitando a educação inclusiva, e do posicionamento do Conselho Nacional de Educação não apenas favorável à educação inclusiva, mas à garantia dos direitos humanos, infelizmente nos deparamos com pessoas e instituições que não querem mudanças e não aceitam que pessoas com deficiência sejam protagonistas de suas próprias histórias.

O direito de estudar na escola com os pares da própria geração é um direito humano assim como o direito de existir, e é por esse caminho que precisamos avaliar.

Desejo que meus filhos e todos os filhos com e sem deficiência desse país não cresçam com as lacunas da minha geração, e que reconheçam que vivemos na sociedade das diferenças e da diversidade. Somos todos gente e pessoas com e sem deficiência, mas antes de tudo somos seres humanos únicos e pertencemos à mesma humanidade.

Ninguém pode dispor dos nossos direitos e não podemos dispor de direitos que não nos pertencem.

E por todos esses motivos, apóio a Resolução No 13 de 2009 do CNE, com certeza em concordância com a Constituição Federal nos arts 5o, 205, 206 , 208 e 227, com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com deficiência, que vigora com valor de Emenda Constitucional, nos arts 7o, 24 e todos os demais, de acordo com a Convenção da Guatemala, e em respeito aos direitos humanos e fundamentais da pessoa, ao art 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente e inclusive na LDB, art 21.

Passado o primeiro ano da ratificação da Convenção, é preciso estabelecer o que é ou não Constitucional para permitir os avanços que beneficiarão 25.000.000 de brasileiros com deficiência e, por consequência, toda a sociedade. É preciso diferenciar educação, saúde e assistência social, principalmente em benefício das milhares de crianças com deficiência ainda fora da escola e para a garantia de que o direito à educação, inquestionável, inalienável e indisponível não seja violado.

*Texto elaborado em setembro de 2009, em razão da comemoração do primeiro aniversário da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência no Brasil.

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