Ally e Ryan

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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O Movimento das Pessoas com Deficiência e a Assembleia Nacional Constituinte.

Mário Cléber Martins Lanna Júnior.

Capítulo 4.

A Assembleia Nacional Constituinte (ANC) foi um importante acontecimento para o movimento das pessoas com deficiência, em decorrência da comoção e da mobilização social diante da expectativa de uma nova Constituição. A história da República brasileira foi marcada por dificuldades para implementar a democracia. A República oscilou entre períodos liberais na Primeira República (1889-1930) com instável experiência democrática (1945-1964) e períodos de regimes de exceção, durante as ditaduras de Getúlio Vargas (1930-1945) e a ditadura militar (1964-1985).

Após o fim da ditadura militar, criou-se uma grande expectativa no Brasil para a consolidação de um sistema democrático de governo efetivo e duradouro e, para isso, iniciou-se o processo de elaboração de uma nova Constituição. Todas as esperanças dos brasileiros e das brasileiras que sofreram por 21 anos a repressão do Estado comandado pelos militares foram depositadas na nova Carta Magna. O movimento das pessoas com deficiência também participou desse processo, na busca pela inserção de suas demandas no texto constitucional.

A Emenda Constitucional n° 26, de 27 de novembro de 1985, atribuiu poderes constituintes aos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e determinou sua reunião, unicameralmente, em Assembleia Nacional Constituinte (ANC), a partir de 1° de fevereiro de 1987. Um anteprojeto de Constituição foi elaborado pela Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, criada pelo Poder Executivo em 1986 e que ficou conhecida como "Comissão Afonso Arinos", por ser dirigida pelo jurista e ex-deputado federal Afonso Arinos de Melo Franco.

O texto constitucional foi construído com base nos trabalhos de 24 subcomissões que compunham nove comissões temáticas. O Regimento Interno da ANC determinou, dentre outras medidas, o recebimento de sugestões de órgãos legislativos subnacionais, de entidades associativas e de tribunais, além de parlamentares; a realização de audiências públicas pelas subcomissões para ouvir a sociedade; a apreciação de emendas populares respaldadas em pelo menos 30 mil assinaturas; e a obrigatoriedade do voto nominal nas matérias constitucionais.

Os trabalhos das comissões foram intensos e, entre os dias 7 de abril e 25 de maio de 1987, ocorreram mais de 200 audiências públicas realizadas com as subcomissões. Tanto os resultados das discussões nas subcomissões quanto as emendas populares foram encaminhados à Comissão de Sistematização. Em 24 de novembro, o Projeto aprovado pela Comissão de Sistematização foi entregue ao presidente da ANC. Entre fevereiro e setembro de 1988, o projeto foi discutido, quando representantes das entidades da sociedade civil defenderam as emendas populares. O plenário aprovou a redação final do texto em 22 de setembro e, finalmente, em 5 de outubro, foi promulgada a atual Constituição da República Federativa do Brasil, que, pela abertura dada à participação popular no processo de sua elaboração – algo inédito no histórico constitucional do país –, recebeu a adjetivação de "Constituição Cidadã".

Até esse momento da história, em termos constitucionais, a única referência aos direitos das pessoas com deficiência era a Emenda n° 12, de 1978, conhecida como "Emenda Thales Ramalho", que no seu artigo único define:. "É assegurado aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica especialmente mediante: I. educação especial e gratuita; II. assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do país; III. proibição de discriminação, inclusive quanto a admissão ao trabalho ou ao serviço público e a salários; IV. possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.

Segundo Messias Tavares, militante da FCD e coordenador da Onedef na época da Constituinte, esta emenda foi gestada em Pernambuco, em discussões entre a Associação de Deficientes Motores de Pernambuco (ADM), a Fraternidade Cristã de Doentes e Deficientes (FCD) e o deputado Thales Ramalho, que possuía uma deficiência física por sequela de um acidente vascular cerebral.

As pessoas com deficiência participaram ativamente das discussões da ANC. Assuntos relacionados a esse grupo foram tratados na Subcomissão dos Negros, Populações Indígenas, Pessoas Deficientes e Minorias, subordinada à Comissão Temática da Ordem Social, que realizou oito audiências públicas, sendo três destinadas a discutir questões atinentes às pessoas com deficiência: a audiência do dia 27 de abril, "Deficientes Mentais; Alcoólatras; Deficientes Auditivos"; a do dia 30 de abril, "Deficientes Físicos; Ostomizados; Hansenianos; Talassêmicos" e a do dia 4 de maio, "Deficientes Visuais; Hemofílicos; Negros".

A articulação do movimento das pessoas com deficiência para participar da ANC ocorreu de duas maneiras: em 1986, por meio do ciclo de encontros "A Constituinte e os Portadores de Deficiência", realizado em várias capitais brasileiras pelo Ministério da Cultura entre 1986 e 1987.

Os debates no âmbito nacional sobre a nova Constituição tiveram início já em 1986, mesmo antes da instalação da ANC. Um importante fator que fomentou essas discussões foi a presença de Paulo Roberto Guimarães, militante do movimento das pessoas com deficiência desde o final da década de 1970 e membro da Comissão Organizadora do 1° Encontro Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes, realizado em 1980, no Ministério da Cultura. Em 1986, Paulo Roberto era responsável pelo "Programa de Cultura e Portadores de Deficiência" e organizou um ciclo de encontros, durante o segundo semestre de 1986, em 11 capitais brasileiras. Paulo Roberto Guimarães foi o cidadão "não parlamentar" que mais pronunciamentos fez durante as audiências públicas na Assembleia Nacional Constituinte.

Durante a última audiência da Comissão da Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher, Paulo Roberto falou logo depois do ex-governador Leonel Brizola: "É com muita alegria e admiração rara que vejo que Vossa Excelência também se preocupa com os não indivíduos, os exilados, os velhos. Sua Excelência também se preocupa com os indivíduos, os exilados internos, os apátridas. Vossa Excelência não é mais um exilado, mas muitos ainda o são. Os negros e os velhos são exilados neste país. Nós mesmos somos exilados dos banheiros, das escolas das instituições, dos palácios, da nossa própria casa. Somos exilados internos deste país, e o Sr. Governador percebeu isso. Alias, ele é positivamente esperto por que percebe a realidade, justamente porque viveu a lógica dos que perderam a cidadania. Somos os sem sujeito, histórica, política e culturalmente deserdados, e vamos, com certeza, herdar cultura. (...) A soberania de uma nação reside no fato de ela poder respeitar todos seus integrantes. Aí sim, ela será forte. Como pode haver uma nação forte se seus indivíduos são mutilados em progressão geométrica, enquanto o assistencialismo e o paternalismo auxiliam em progressão aritmética?"

Na mesma ocasião, Paulo Roberto concluiu:

"Senhor Governador, estou encantado com as suas palavras. E acho que as autoridades brasileiras precisam parar de falar que os nossos problemas são de saúde, de educação e, quando muito, de transporte. Na verdade, o nosso grande problema é de direito, de cidadania, de existência. Estamos sendo massacrados, quem não sabe disso? Os pobres estão sendo massacrados. Desprezam e massacram toda a forma de pobreza, a deficiência, a velhice, o fato de ser menor e não ser criança. Este país está sendo massacrado, completamente massacrado."

Paulo Roberto publicou, em 1990, o livro "Cultura, Diferença e Deficiência", coletânea de artigos e pronunciamentos.

Ele recorda que naquela época não existia CORDE ou qualquer outro órgão gestor da política da pessoa com deficiência. "Durante a Constituinte, não existia nada; tínhamos que começar do zero. Nessa época, quem elaborava a política do governo para pessoas com deficiência era o Ministério da Educação e o da Cultura". Ainda segundo Paulo Roberto, o trabalho da Educação ainda era muito voltado às associações filantrópicas e assistenciais. "A primeira vez que se teve um trabalho do ponto de vista da garantia dos direitos das pessoas com deficiência foi via Ministério da Cultura".

O ciclo promoveu encontros em São Paulo – em duas ocasiões –, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador, Recife, Florianópolis, Belém, Curitiba e Goiânia.

Participaram de todos os debates Cândido Pinto de Melo, do MDPD; Luzimar Alvino Sombra, assessor jurídico do Centro Nacional de Educação Especial (Cenesp); e Paulo Roberto Guimarães, coordenador do Programa de Cultura e Portadores de Deficiência do Ministério da Cultura. O objetivo com o ciclo de encontros era estimular o debate e articular as pessoas com deficiência para reivindicarem direitos e garanti-los no texto constitucional. Após o término dos encontros, o Ministério da Cultura continuou a auxiliar o movimento das pessoas com deficiência assessorando e patrocinando viagens a Brasília de alguns líderes para negociações com parlamentares constituintes.

Uma das principais reivindicações das pessoas com deficiência discutida nos encontros era que o texto constitucional não consolidasse a tutela, e, sim, a autonomia. Nesse sentido, os argumentos do movimento não eram consentâneos ao anteprojeto de Constituição, elaborado pela Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, que tinha um capítulo intitulado "Tutelas Especiais", específico para as pessoas com deficiência e com necessidades de tutelas especiais. O movimento não queria as tutelas especiais, mas, sim, direitos iguais garantidos juntamente com os de todas as pessoas. A separação, na visão do movimento, era discriminatória. Desde o início da década de 1980, a principal demanda do movimento era a igualdade de direitos, e, nesse sentido, reivindicavam que os dispositivos constitucionais voltados para as pessoas com deficiência deveriam integrar os capítulos dirigidos a todos os cidadãos. O movimento vislumbrava, portanto, que o tema deficiência fosse transversal no texto constitucional.

A segunda etapa de discussões do movimento ocorreu entre o final de 1986 e 1987, nos encontros de conselhos, assessorias e coordenadorias de pessoas com deficiência de todo o Brasil. Durante a 3° Reunião de Conselhos e Coordenadorias Estaduais e Municipais de Apoio à Pessoa Deficiente – realizada em Belo Horizonte, de 5 a 7 de dezembro de 1986 e que contou com representantes de coordenadorias e conselhos de todo o Brasil, além de entidades de e para pessoas com deficiência –, o movimento aprovou uma proposta a ser levada à Assembleia Nacional Constituinte. No documento que sintetizava as propostas (QUADRO 4) para a Constituição, a preocupação em não se criar um capítulo específico para as pessoas com deficiência ganhou destaque, conforme relatado em um jornal do movimento:

A alternativa de incluir na Constituição um texto, à parte, abordando, simultaneamente, os direitos fundamentais das pessoas portadoras de deficiência, é admissível, mas, com muita probabilidade, reforçadora da segregação e do estigma. A distribuição da matéria pelos temas básicos da Carta Magna contribui para o reconhecimento de que as pessoas portadoras de deficiência mereçam ter seus direitos assegurados nos lugares próprios, onde são disciplinados os direitos de todos os cidadãos.

Era, portanto, consenso no movimento a contrariedade em relação à adoção de um capítulo específico para tratar das pessoas com deficiência na Constituição. O documento que consolidou as discussões organizadas pelo Ministério da Cultura e dos encontros de conselhos, assessorias e coordenadorias resultou nas propostas aprovadas na 3° Reunião de Conselhos e Coordenadorias. Esse documento foi a base do texto entregue ao presidente da subcomissão das minorias, deputado Ivo Lech.

Após a fase de sistematização do texto da Constituição a ser votado em plenário, as propostas do movimento das pessoas com deficiência não foram incorporadas da forma esperada. Em decorrência disso, o movimento preparou um projeto de Emenda Popular e iniciou campanhas em todo o Brasil para recolher as 30 mil assinaturas necessárias para submetê-lo à ANC.

A Emenda Popular n° PE00086-5 foi submetida à ANC sob a responsabilidade de três organizações do movimento das pessoas com deficiência, a Onedef, o Movimento de Defesa das Pessoas Portadoras de Deficiência (MDPD) e a Associação Nacional dos Ostomizados, e contou com 32.899 assinaturas. A proposta continha 14 artigos sugerindo alterações no projeto da Constituição, onde coubessem temas como igualdade de direitos, discriminação, acessibilidade, trabalho, prevenção de deficiências, habilitação e reabilitação, direito à informação, educação básica e profissionalizante.

Messias Tavares de Souza, à época coordenador da Onedef, foi o escolhido pelo movimento para defender a Emenda Popular na Assembleia Nacional Constituinte. Em discurso pronunciado no plenário, afirmou que várias das propostas das pessoas com deficiência não estavam sendo contempladas no texto constitucional. Messias Tavares expôs um histórico das lutas das pessoas com deficiência por autonomia, destacou as diferenças entre as organizações de e para pessoas com deficiência e criticou o relatório da Subcomissão dos Negros, Populações Indígenas, Pessoas Deficientes e Minorias, no qual as propostas do movimento das pessoas com deficiência perdiam espaço para as das entidades assistencialistas:

A organização de entidade de cunho assistencial e paternalista, no Brasil, começou há mais de trinta anos. Cabe a ela, historicamente e ainda hoje, desafogar a consciência pesada, coletiva, do sistema ‘feudal’ e capitalista emergente, provocada pela miséria progressiva e a crescente perda do valor do ser humano, em prol do culto à máquina, ao capital.

No decorrer dos anos 50 e 60, a miséria causada pela pobreza e deficiências, se organiza nos grandes centros. A esmola disfarçada ou o subemprego, como a venda organizada de balas, vêm criar as pequenas iniciativas de organização, sem liberdade ou usando a exploração, o que perdura até hoje.

Na década de 70, os portadores de deficiência, bem como os negros, as mulheres e outros grupos da sociedade civil, resolvem se organizar, por uma questão de sobrevivência. O abandono e a atomização, pelas quais passam as minorias, chegam a um grau insuportável. Surgem, então, pelos recantos mais politizados do País, associações que, ainda usando o lazer como pretexto, promove a conscientização, comandadas por líderes eventuais e raros. Implantam-se então as discussões regionais, sem que cada uma saiba da existência das outras.

De 1979 até nossos dias, formam-se as organizações nacionais de cegos, hansenianos, portadores de deficiências físicas, surdos, ostomizados, talassêmicos, diabéticos, renais crônicos, paralisados cerebrais, entre outros, sem que haja uma representação geral destes segmentos, como resposta a uma necessidade, que já se faz sentir.

[…].

O relatório inicial da Subcomissão tinha o tom do relatório da Federação Nacional das APAEs. Estava em jogo a vitória do passado assistencialista e paternalista e o presente de luta por direitos burgueses, mínimos e necessários à cidadania, à possibilidade de sermos sujeitos além de objetos das políticas da sociedade e do governo.

O que Messias Tavares defendia, na ocasião do discurso, era que o texto constitucional garantisse às pessoas com deficiência a possibilidade de uma vida autônoma e de exercício pleno da cidadania. Voltava-se, dessa forma, às principais bandeiras de luta do movimento desde o início de sua organização: a autonomia e o protagonismo.

Na emenda popular sugeriu-se, por exemplo, para o capítulo "Dos Direitos Individuais", a seguinte redação: "Art. [...] Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas ou por ser portador de deficiência de qualquer ordem." A intenção era inserir a explícita igualdade de direitos para as pessoas com deficiência. Na redação final da Constituição determinou-se: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza", sem especificá-las.

Na emenda popular também se propunha transformar a "aposentadoria por invalidez" em "seguro-reabilitação". O objetivo era permitir que a pessoa com deficiência trabalhasse em uma função diferente após a reabilitação, mas, quando em situação de desemprego, contaria com o seguro, que subsidiaria o período de recolocação profissional. Essa foi uma das propostas que não foi incorporada à Constituição promulgada em 1988. Proposta diferenciada substituiu esse artigo e foi encaminhada por outra Emenda Popular, n° PE00077-6, de autoria da Associação Canoense de Deficientes Físicos, da Escola Especial de Canoas e da Liga Feminina de Combate ao Câncer, e que previa o pagamento de um salário mínimo mensal às pessoas com deficiência que não tivessem meios de se manter. Essa proposta gerou o Benefício da Prestação Continuada (BPC).

Para parte do movimento das pessoas com deficiência, a proposta do BPC representa uma tutela que afronta os paradigmas que estimularam o surgimento de organizações de pessoas com deficiência, ocorrido desde o final da década de 1970. O principal argumento dos que são contrários ao BPC é que ele estimula a tutela ao invés de proporcionar às pessoas com deficiência mecanismos de conquista da autonomia. Teresa Costa d’Amaral, à época coordenadora da Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE), explica que a proposição do BPC partiu de uma iniciativa individual:

Por exemplo, tem um fato interessante da Constituinte: há um artigo que cria o Benefício da Prestação Continuada. E, em relação à criação desse benefício, o movimento era contra, eu fui contra. Mas uma senhora, mãe de um deficiente do Rio Grande do Sul, resolveu que ela ia fazer passar um benefício para o filho dela que era deficiente intelectual e para os outros deficientes. Conseguiu o número de assinaturas que eram necessárias para uma Emenda Popular e conseguiu incluir sua proposta. (Teresa Costa d’Amaral. Depoimento oral, 28 de abril de 2009)

O movimento das pessoas com deficiência articulou-se de forma efetiva em torno do objetivo de incorporar suas demandas no texto constitucional. Mesmo quando, ainda durante a fase de sistematização, tais demandas não foram incorporadas ao projeto do texto constitucional, o movimento mostrou força e se rearticulou rapidamente na elaboração da emenda popular. O principal êxito dessa luta foi o fato de o movimento ter conseguido superar a lógica da segregação presente na proposta do capítulo "Tutelas Especiais" e incorporar, mais do que direitos ao longo de todo o texto constitucional, ao menos pelo viés legal, o princípio da inclusão das pessoas com deficiência na sociedade.

As impressões do movimento sobre as conquistas na Constituição de 1988 podem ser percebidas nos depoimentos de Rosângela Berman Bieler e Romeu Kazumi Sassaki:

"A gente conseguiu, na reforma constitucional, distribuir o tema da deficiência em todos os artigos constitucionais, o que já é vanguarda. [...] Quando você pega um texto constitucional, há duas opções estratégicas: ou se cria um bloco inteiro sobre deficiência [...], pega tudo e joga ali naquela caixinha, que não só é mais fácil de botar como é fácil de tirar; ou se integra o tema em todo o corpo constitucional, nos tópicos do direito do cidadão, do direito à saúde, do direito à educação." (Rosângela Berman Bieler. Depoimento oral, 2 de fevereiro de 2009)

"Em 1986, já estava pronto o anteprojeto da Constituição. Se você comparar o anteprojeto com a Constituição de 1988, vai ver a grande diferença, o quanto nós conseguimos interferir. O anteprojeto era muito fraco, com aquela visão antiga, paternalista, sobre pessoas com deficiência. Ali realmente nós crescemos." (Romeu Kazumi Sassaki. Depoimento oral, 5 de fevereiro de 2009)

O esforço de unificação nacional das pessoas com deficiência, durante a década de 1980, passou por rearranjos políticos importantes que resultaram na organização do movimento por grupos com a mesma manifestação da deficiência. Esse rearranjo foi visto por muitos militantes da época como insucesso na tentativa de criar uma grande organização nacional, unificada em torno da Coalizão. No entanto, a experiência de articulação do movimento adquirida no início da década de 1980 foi bastante profícua para que, independentemente do tipo de deficiência, se conseguisse incorporar os princípios de igualdade na Constituição de 1988.

Tabela 1.4 - Propostas aprovadas na 3ª Reunião de Conselhos e Coordenadorias Estaduais e Municipais de Apoio à Pessoa com deficiência

1. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicções políticas ou por ser pessoa com deficiência de qualquer ordem. Será punida pela lei toda discriminação atentatória aos direitos humanos.

2. Garantir e proporcionar a prevenção de doenças ou condições que levem à deficiência.

3. Assegurar às pessoas com deficiência o direito à habilitação e reabilitação com todos os equipamentos necessários.

4. Assegurar às pessoas com deficiência o direito à educação básica e profissionalizante obrigatória e gratuita, sem limite de idade, desde o nascimento.

5. A União, os Estados e os Municípios devem garantir para a educação das pessoas com deficiência, em seus respectivos orçamentos, o mínimo de 10% do valor que constitucionalmente for destinado à educação.

6. Proibir a diferença de salário e de critério de admissão, promoção e dispensa, por motivo discriminatório, relativos a pessoa com deficiência, raça, cor, sexo, religião, opinião política, nacionalidade, idade, estado civil, origem e a condição social.

7. Conceder a dedução no Imposto de Renda, de pessoas físicas e jurídicas, dos gastos com adaptação e aquisição de equipamentos necessários ao exercício profissional de pessoas com deficiência. Regulamentar e organizar o trabalho das oficinas abrigadas para pessoas portadoras de deficiência, enquanto não possam integrar-se no mercado de trabalho competitivo.

8. Transformar a "aposentadoria por invalidez" em "seguro-reabilitação" e permitir à pessoa com deficiência trabalhar em outra função diferente da anterior, ficando garantido este seguro sempre que houver situação de desemprego.

9. Garantir a aposentadoria por tempo de serviço aos 20 (vinte) anos de trabalho, para as pessoas com deficiência que tenham uma expectativa de vida reduzida.

10. Garantir o livre acesso a edifícios públicos e particulares de frequência aberta ao público, a logradouros públicos e ao transporte coletivo, mediante a eliminação de barreiras arquitetônicas, ambientais e a adaptação dos meios de transporte.

11. Garantir ações de esclarecimento junto às instituições de ensino, às empresas e às comunidades, quanto à importância de prevenção de doenças ou condições que levam à deficiência.

12. Garantir o direito à informação e à comunicação, considerando-se as adaptações necessárias para as pessoas com deficiência.

13. Isentar os impostos às atividades relacionadas ao desenvolvimento de pesquisa, produção, importação e comercialização de material ou equipamento especializado para pessoas com deficiência.

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