Ally e Ryan

Ally e Ryan

domingo, 9 de janeiro de 2011

do livro: História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil


Rumo a um novo modelo

Na perspectiva atual, as especificidades de cada tipo de deficiência não podem sobrepujar, em momento algum, a consciência de que a conquista de novos avanços depende, sobretudo, da produção de um discurso agregador. É desse equilíbrio negociado que surge a força e o potencial transformador do movimento. Nesse sentido, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e as Conferências Nacionais de Direitos da Pessoa com Deficiência trouxeram um novo fôlego ao movimento.

Do modelo de integração até a sociedade inclusiva, o movimento político das pessoas com deficiência vem trabalhando, intensamente, para alcançar um novo patamar de dignidade humana.

Ainda convive com resquícios de segregação, muito de integração, e são incipientes as práticas de inclusão, as quais apresentam a diversidade humana como regra e, por conseguinte, têm como princípios norteadores da sociedade o respeito e a valorização das diferenças. Autonomia, direito a fazer sua própria escolha, vida independente e não discriminação podem ser sumarizados pelo lema “Nada sobre nós sem nós”.

Surge a nova questão: como podemos fazer a junção dos Direitos Humanos e a pessoa com deficiência, ou melhor, com esse atributo característico da fragilidade do ser humano?

O reconhecimento das especificidades e particularidades das pessoas com deficiência foi a principal conquista do movimento nos últimos trinta anos. O início do século XXI, no entanto, consagra o discurso dos Direitos Humanos, que considera as diferenças, mas vai além das questões específicas.

Pessoas com deficiência são sujeitos de direitos – cidadãos e cidadãs. Do modelo médico passamos ao campo dos Direitos Humanos – políticos, civis, econômicos, sociais, culturais e ambientais – na construção de uma sociedade para todos. O foco das discussões é o modo como – e para quem – a sociedade organiza o cotidiano, as cidades, os bens e serviços disponíveis de educação, cultura, trabalho, saúde, proteção social, habitação, transporte, lazer, esporte, turismo e outros aspectos da vida comunitária. “Iguais na diferença” é a proposta.

Definitivamente, está em andamento uma mudança de paradigma: a sociedade, que via esse segmento populacional como alvo de caridade, passa a entender que se busca tão somente a promoção e a defesa de seus direitos, em bases iguais com os demais cidadãos. É irrelevante se as pessoas apresentam ou não algum grau de limitação funcional. O que está em jogo são a equiparação de oportunidades e a nova interface entre o indivíduo e o ambiente sem obstáculos. Esse avanço está refletido inclusive na organização institucional do Estado brasileiro, que inseriu o tema da pessoa com deficiência na área dos direitos humanos. Assim, foi construído um diferencial positivo quando comparado à maioria dos países.

Na organização social contemporânea, o movimento das pessoas com deficiência tem a possibilidade de avançar em direção a novas bandeiras e conquistas. No final da década de 1970, o importante era ser protagonista político na garantia de seus direitos. Nessa luta, as pessoas com deficiência no Brasil passaram pela redemocratização, pelo AIPD, pela Coalizão Pró-Federação, pela Constituição de 1988, por encontros, congressos, reuniões, simpósios, atos públicos, conferências e pela Convenção da ONU e sua ratificação no país como o primeiro tratado de direitos humanos com equivalência de emenda constitucional.

O movimento encontra-se diante do desafio de seus próximos passos: primeiro, garantir que os instrumentos legais, até então conquistados, sejam implantados e implementados na vida cotidiana; segundo, construir um discurso comum que ao mesmo tempo considere as particularidades de cada pessoa com deficiência e promova a convergência para a luta por direitos e não discriminação; terceiro, formar e fortalecer novas lideranças capazes de estabelecer metas a serem ultrapassadas e dar continuidade à história do movimento político das pessoas com deficiência no Brasil; e, por fim, se unir a outros segmentos da população compartilhando sua história, seus aprendizados e suas conquistas para garantir que sejam superadas as situações de vulnerabilidades e de violações de direitos que afetam a crianças, adolescentes, idosos, homossexuais, trabalhadores e a qualquer pessoa com ou sem deficiência e que juntos possam construir uma sociedade mais justa, igualitária, tolerante e pacífica na qual, de fato, sejam os direitos humanos de todos e para todos.

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