Descrição da imagem: uma foto em formato retangular, onde apareço (sentado na cadeira de rodas) ao lado da minha esposa, numa sala ampla com um sofá ao fundo, uma mesa atrás e outra na frente, estamos sorrindo
05/10/2012 - Claudia Sanchez.
Este artigo busca aportar elementos de reflexão em
torno do tema da diversidade, da deficiência e da inclusão desde a ótica da
atuação na sociedade das pessoas em situação de deficiência, de forma que
contribuam na geração de ações para melhorar sua qualidade de vida, sempre e
quando isso seja permitido pelo entorno, pelo meio ambiente. Para seu
desenvolvimento, o artigo parte do conceito de pessoa em situação de
deficiência, destaca a transcendência dos fatores ambientais e estabelece
relações com a ideia de diversidade.
Pessoa
em Situação de Deficiência.
Quando se fala da pessoa em situação de
deficiência, está aí envolvida a relação entre a pessoa e o meio; e, como em
qualquer relação, a responsabilidade por possibilitar o seu estabelecimento é
tanto da pessoa como do entorno físico ou natural, tanto aquele construído pelo
homem - as cidades - ou o ambiente social, também edificado pelo ser humano,
que inclui as atitudes, as convicções pessoais e sociais e, finalmente,
políticas e leis. Em suma, o espaço no qual uma pessoa desenvolve sua vida.
A concepção que atribui a responsabilidade da
construção da deficiência à sociedade, o modelo social da deficiência, foi
alcançado depois de muitos anos, como superação do modelo individual da
deficiência, que colocava a condição deficiente apenas na pessoa, como uma
característica intrínseca do indivíduo. A noção do efeito causado pelo entorno
na edificação da deficiência e por consequência, na atuação de todas as pessoas
– inclusive, da pessoa em situação de deficiência na sociedade - evoluiu
bastante nas últimas décadas. Até porque as barreiras e os obstáculos
ambientais e culturais não são permanentes; podem e devem ser alterados, sempre
e quando os diversos segmentos da sociedade aceitem sua própria responsabilidade
e a necessidade da mudança.
A Classificação Internacional de Funcionalidade,
Deficiência e Saúde (CIF),
utiliza o termo deficiência “para denominar um fenômeno multidimensional,
resultado da interação das pessoas com seu entorno físico e social”. A
existência dessa interação, como ação que se exerce de forma recíproca entre
dois agentes, faz com que o próprio conceito de deficiência incorpore, de forma
mais explícita ou mais implícita, a dimensão social como sendo chave, tornando
incabível, então, admitir as situações de deficiência sem levar em consideração
tal dimensão.
A deficiência se entende como geradora de
processos, em virtude dos quais não chegam a ser adquiridos, se deterioram ou
desaparecem determinados vínculos ou relações que as pessoas mantém e que lhes
permite dar resposta a suas necessidades, desenvolver-se pessoalmente,
participar da comunidade e obter e manter uma qualidade de vida satisfatória.
Ou seja, a deficiência como uma construção entre o indivíduo e a sociedade,
suscetível de ser superada, sempre e quando os processos sociais assim o
permitam.
Em oposição aos enfoques da deficiência em termos
de normalidade/anormalidade, estudados por diversos autores, o sociólogo
Guillermo Páramo Rocha afirma que “a diversidade trata de uma dimensão
fundamental que promove a assimilação das pessoas na sociedade de acordo com as
condições de cada um, independentemente das peculiaridades diversas que
caracterizam os indivíduos”.
Definições
da CIF.
As definições estabelecidas pela CIF, no contexto
da saúde, são as seguintes:
·
Funções
corporais: as funções fisiológicas dos
sistemas corporais (incluindo as funções psicológicas).
·
Estruturas
corporais: as partes anatômicas do corpo, tais
como os órgãos, os membros e seus componentes.
·
Deficiências: os problemas nas funções ou nas estruturas
corporais, tais como um desvio significativo ou uma perda.
·
Atividade: a realização de uma tarefa ou ação por parte de
um indivíduo.
·
Participação: o ato de envolver-se em uma situação vital.
·
Limitações
na atividade: as dificuldades que um indivíduo
pode experimentar no desempenho/realização de atividades.
·
Restrições
na participação: os problemas que um indivíduo pode
experimentar para envolver-se em uma situação vital.
·
Fatores
ambientais: o ambiente físico, social e atitudinal no qual as pessoas vivem.
·
Fatores
contextuais: a essência integral tanto da vida
de um indivíduo como do seu estilo de vida.
Estão aqui incluídos os fatores ambientais e pessoais
que podem ter efeitos na pessoa, na condição de sua saúde e nos estados
‘relacionados com a saúde’ dessa mesma pessoa. Nossa cultura tende a
estigmatizar o diferente, a marginalizá-lo, a excluí-lo, ao invés de
valorizá-lo, aceitá-lo e assimilá-lo como valor que tem a qualidade de
enriquecer os grupos humanos. É a partir de sua diversidade que os membros de
uma sociedade podem fazer sua contribuição à comunidade para construir uma
sociedade inclusiva.
A falta de resposta às necessidades das pessoas em
situação de deficiência faz com que a exclusão se torne social e economicamente
intolerável, particularmente em países em vias de desenvolvimento, com o
desperdício de talentos, de habilidades potenciais e deixando de lado uma
porcentagem considerável de cidadãos com possibilidades reais de participar
ativamente na sociedade.
O contrário disso, a resposta a essas necessidades,
permitiria chegar a uma sociedade inclusiva, ou sociedade para TODOS, conforme
o enfoque da Resolução 45/91 da Organização das Nações Unidas (ONU), assinada
durante sua Assembleia Geral em dezembro de 1990.
A CIF, aprovada em 2001 e desenvolvida pela
Organização Mundial da Saúde (OMS), foi e segue sendo fundamental para a
compreensão dos conceitos de funcionalidade e deficiência:
·
ao apresentar a deficiência como um
processo interativo e evolutivo, na qual é necessário levar em conta a condição
de saúde e os fatores contextuais, tanto ambientais como pessoais, que podem
resultar limitantes para a realização de atividades e para a participação/funcionalidade
das pessoas no meio social;
·
ao defender que tanto o entorno
físico como o social são fatores decisivos na deficiência e as imperfeições de
projetos são causa de limitações e redução de oportunidades.
A prevalência de limitações permanentes nas funções
ou nas estruturas corporais, bem como a perda de habilidades em decorrência do
envelhecimento, que se evidenciam nas estatísticas leva a considerar a
importância e a responsabilidade que têm os urbanistas, projetistas e
construtores do meio físico na busca de propostas, alternativas e soluções de
edificações seguras, cômodas e confortáveis, que garantam uma melhor qualidade
de vida à população em geral e permitam uma real inclusão aos grupos
vulneráveis marginalizados como consequência de projetos excludentes.
Funcionalidade
humana e entorno.
A funcionalidade humana é concebida pela CIF em
três dimensões: biológica, psicológica e social. O termo FUNCIONALIDADE abrange
funções e estruturas corporais, atividades e participação, e indica os fatores
positivos da interação entre um indivíduo e seus diversos fatores contextuais.
É a restrição de tal inter-relação que impõe
limites ao desempenho e à possibilidade das pessoas em situação de deficiência
de se expressar produtivamente e de atingir uma melhor qualidade de vida.
Quando não existe a adequada relação entre a condição de deficiência e os
fatores ambientais e pessoais, surge a exclusão devido ao entorno, entorno que
impede a participação ou o acesso.
A exclusão devida ao entorno - ou meio ambiente
excludente - tem gerado respostas dos arquitetos, as quais têm evoluído desde a
eliminação de barreiras até a concepção de novos paradigmas de projeto, como o
da acessibilidade, que permite, em qualquer espaço interno ou externo, o fácil
deslocamento da população em geral e o uso de forma confiável e livre de riscos
dos serviços ali instalados, permitindo que as pessoas se aproximem, entrem,
usem e saiam desses ambientes em condições de segurança e com a maior autonomia
e conforto possíveis.
Esse meio ambiente acessível inclui, além das
edificações e dos espaços urbanos públicos e privados, as relações
interpessoais e as atitudes individuais e coletivas. Os fatores que fazem um
ambiente ser produtor de exclusão são criados pelo ser humano - ou seja, parte
da nossa cultura – sendo, portanto, reversíveis ou modificáveis. E, na medida
em que o entorno excludente evolua para um entorno inclusivo, esse se torna
gerador de qualidade de vida, ‘habilitador’ para as pessoas em situação de
deficiência.
Também o conceito de qualidade de vida passa a se
estruturar e a se fortalecer num contexto cada vez mais consciente da
importância do entorno na vida das pessoas. Possivelmente, na atualidade, o
entendimento da inclusão se encontra na confluência das ideias da não exclusão
e aquela da acessibilidade universal (ou desenho universal, desenho inclusivo,
desenho para todos), que tem como objetivo beneficiar a todos, tornando o meio
ambiente mais franqueado para o maior número de pessoas e situações, entendendo
e respeitando a diversidade de identidades, necessidades e capacidades de todos
e de cada um.
Tanto a CIF como o desenho universal, ou
acessibilidade universal, reconhecem que o meio ambiente físico possui a
responsabilidade no desempenho dos seres humanos e admitem que as pessoas sem
deficiência também sofrem as consequências e restrições de um entorno
excludente.
O caminho na direção de uma sociedade na qual todos
tenhamos as mesmas possibilidades deve começar por assumir o fato de que somos
todos diferentes – maravilhosamente diferentes. Baixos. Altos. Fracos. Fortes.
Corpulentos. Jovens. Velhos. E não importa se estás apaixonado, engessado ou se
tens uma deficiência. Que tal se o design e a arquitetura fossem tão variados e
excitantes como as pessoas para quem foram pensados?
Sociedade
inclusiva e Ética da Diversidade.
A partir do princípio da inclusão se pretende um
mundo e uma sociedade onde todas as pessoas tenham lugar e os mesmos direitos.
No entanto, essa sociedade não é formada por seres uniformes, moldados por um
mesmo padrão.
Atuar no âmbito da inclusão exige o compromisso com
a chamada "ética da diversidade", que parte da premissa do direito à
diferença, na qual todos os indivíduos e coletivos possuem atributos distintos
e, assim, podem aportar seus valores para a construção dessa sociedade
inclusiva que se almeja, aproveitando ao máximo as capacidades dos grupos
heterogêneos: com esse objetivo, cada uma das pessoas é valorizada pelo que é e
por suas potencialidades, independente de sua idade, sexo, raça, etnia,
habilidade, etc.
Em uma sociedade inclusiva, as relações que as
pessoas mantêm – e que lhes permite dar resposta às suas necessidades,
desenvolver-se pessoalmente, participar na comunidade, obter e manter uma qualidade
de vida satisfatória – estão determinadas pela capacidade ou possibilidade de
exercer seus direitos e, em particular, seus direitos sociais, tais como o
direito ao trabalho, à moradia, à cultura, à educação, à saúde, entre outros.
O conceito de qualidade de vida, como resultante da
interação da pessoa com os fatores ambientais, leva em consideração os aspectos
subjetivos, valores, preferências e satisfação num contexto social, econômico e
político. A qualidade de vida deve estar baseada no conceito de acessibilidade
e desenho universal como condição que deve atingir o entorno, os processos, os
bens, os produtos e os serviços, assim como os objetos ou instrumentos,
ferramentas e dispositivos para serem compreensíveis e utilizáveis por todas as
pessoas em condições de segurança e conforto, da forma mais autônoma possível.
O que se busca é um mundo e uma sociedade onde
todas as pessoas tenham os mesmos direitos e as mesmas oportunidades. Um mundo
e uma sociedade onde se respeitem as diferenças e se ofereçam oportunidades de
participação e construção inclusivas, que permitam a expressão e o livre
desenvolvimento das potencialidades sem nenhum tipo de restrições pessoais nem
ambientais para que seja possível atingir uma plena funcionalidade humana.
Bibliografia.
·
CASADO, D. (1991): Panorámica de la
discapacidad. Barcelona, INTRESS.
·
CASADO, D. (1995): Ante la
discapacidad. Glosas iberoamericanas. Buenos Aires, Lumen. UNIVERSIDAD
NACIONAL. Maestría Discapacidad e Inclusión Social. Discapacidad e Inclusión
Social. Reflexiones desde la Universidad Nacional de Colombia. Febrero de 2005.
·
FANTOVA, F. (1990): Evaluación de
programas de intervención en el tiempo libre con personas con minusvalía en el
Reino Unido, Italia y Francia. Elementos para un marco teórico y descripción
sistemática de una selección de programas.
·
- Exclusión e inclusión social: una
aproximación desde el ámbito de la discapacidad. Tercer Congreso Internacional
de Discapacidad. Inclusión: oportunidades para todo. 2006.
·
NACIONES UNIDAS (1988): Programa de
acción mundial para las personas con discapacidad.
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Madrid, RPPAPM (Real Patronato de
Prevención y de Atención a Personas con Minusvalía).
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OMS (Organización Mundial de la
Salud) (1983): Clasificación internacional de deficiencias discapacidades y
minusvalías. Madrid, INSERSO. OMS – OPS. Ministerio de Trabajo y Asuntos
Sociales de España., 2001. Clasificación Internacional del Funcionamiento, de
la Discapacidad y de la Salud.
Do livro:
Celebrando a
Diversidade. Pessoas com Deficiência e Direito à Inclusão.
Edição 2010.
Organização: Flavia Boni Licht e Nubia Silveira.
Apoio: Planeta Educação - em especial, Elisete Oliveira Santos Baruel e Érika de Souza Bueno.
Capítulo III - Onde está a Deficiência?
Claudia Sanchez (Bogotá).
- arquiteta, presidente do Comitê Técnico sobre Acessibilidade das Pessoas ao Meio Físico do Instituto Colombiano de Normas Técnicas; integrante da equipe de consultores internacionais da AyA Arquitetura e Acessibilidade.
Edição 2010.
Organização: Flavia Boni Licht e Nubia Silveira.
Apoio: Planeta Educação - em especial, Elisete Oliveira Santos Baruel e Érika de Souza Bueno.
Capítulo III - Onde está a Deficiência?
Claudia Sanchez (Bogotá).
- arquiteta, presidente do Comitê Técnico sobre Acessibilidade das Pessoas ao Meio Físico do Instituto Colombiano de Normas Técnicas; integrante da equipe de consultores internacionais da AyA Arquitetura e Acessibilidade.
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