Obs: com o intuito de manter fiel ao texto, termos como "deficiente mental" não foram substituídos por "pessoa com deficiência intelectual"
Maria Salete Fábio Aranha
UNESP-Marília
A década de 60 tornou-se, assim, marcante na promoção de mudanças no padrão de relação das sociedades com a pessoa com deficiência. Considerando que o paradigma tradicional de institucionalização tinha demonstrado seu fracasso na busca de restauração de funcionamento normal do indivíduo no contexto das relações interpessoais, na sua integração na sociedade e na sua produtividade no trabalho e no estudo, iniciou-se no mundo ocidental o movimento pela desinstitucionalização, baseado na ideologia da normalização, como uma nova tentativa para integrar a pessoa com deficiência na sociedade.
A palavra desinstitucionalização tem um prefixo que per se sugere o afastamento de uma instituição. Os primeiros usos da palavra descreviam os esforços para tirar as pessoas de instituições, colocando-as num sistema, o mais próximo possível, do que fosse o estilo de vida normal numa comunidade.
Segundo conceitualização de Braddock, proposta em 1977, “normalização é uma ideologia – um conjunto de idéias que reflete as necessidades e aspirações sociais de indivíduos extraordinários na sociedade” (p.4). Ela presumia a existência de uma condição “normal”, representada pelo maior percentual de pessoas na curva da normalidade e uma condição de “desvio”, representada por pequenos percentuais de pessoas, na mesma curva.
Assim, segundo a autora, “o local típico de residência é o lar privado do indivíduo; o modelo educacional normal (típico) é a educação convencional, numa sala de aula comum; o modelo típico de emprego é o competitivo, para o auto-sustento. Em contraste marcante com tais arranjos – na extremidade anormal do continuum de serviços – têm se congregado as instituições totais, o ensino segregado e a não participação no mercado de trabalho “ (p. 5).
Em função do incômodo representado pela institucionalização em diferentes setores da sociedade e à luz das concepções de “desvio” e de “normalidade” é que foi se configurando, gradativamente, um novo paradigma de relação entre a sociedade e a parcela da população representada pelas pessoas com deficiência: o Paradigma de Serviços.
Este teve, desde seu início, o objetivo de “ajudar pessoas com deficiência a obter uma existência tão próxima ao normal possível, a elas disponibilizando padrões e condições de vida cotidiana próxima às normas e padrões da sociedade.” (American National Association of Rehabilitation Counseling - A.N.A.R.C., 1973).
É interessante observar manifestações que acompanharam o movimento de construção e implementação do novo paradigma, nas palavras de autores da época, em países em que tal processo estava ocorrendo. Nos Estados Unidos, por exemplo, Jones et al (1975) apontaram dois problemas prinicpais provocados pela desinstitucionalização em massa:
1. “sabemos muito pouco sobre o que acontece com pessoas com deficiência mental, quando estas são tratadas como normais” (p. 190)
2. “o processo de normalização se torna mais tenso quando concentra pacientes que não se ‘encaixam’ na política da desinstitucionalização; quando concentra profissionais cujas atitudes faz deles pessoas incapazes de administrá-la e finalmente e quando impõe a ambos expectativas que são manifestamente irrealistas” (p. 190).
Valerie J. Bradley (1978) também tratou de problemas resultantes da implementação de um programa de desinstitucionalização mal planejado:
1. insegurança dos pais – pais que vêm seus filhos sendo retirados de uma instituição e encaminhados para serviços na comunidade, os quais, por diferentes razões não são capazes de oferecer um cuidado global e estável
2. sistema de financiamento – a falta de uma abordagem sistemática ao desenvolvimento e à expansão de recursos obriga entidades a se apoiar em uma variedade de fontes de financiamento, as quais freqüentemente impõem exigências e expectativas conflitantes
Maria Salete Fábio Aranha
UNESP-Marília
A década de 60 tornou-se, assim, marcante na promoção de mudanças no padrão de relação das sociedades com a pessoa com deficiência. Considerando que o paradigma tradicional de institucionalização tinha demonstrado seu fracasso na busca de restauração de funcionamento normal do indivíduo no contexto das relações interpessoais, na sua integração na sociedade e na sua produtividade no trabalho e no estudo, iniciou-se no mundo ocidental o movimento pela desinstitucionalização, baseado na ideologia da normalização, como uma nova tentativa para integrar a pessoa com deficiência na sociedade.
A palavra desinstitucionalização tem um prefixo que per se sugere o afastamento de uma instituição. Os primeiros usos da palavra descreviam os esforços para tirar as pessoas de instituições, colocando-as num sistema, o mais próximo possível, do que fosse o estilo de vida normal numa comunidade.
Segundo conceitualização de Braddock, proposta em 1977, “normalização é uma ideologia – um conjunto de idéias que reflete as necessidades e aspirações sociais de indivíduos extraordinários na sociedade” (p.4). Ela presumia a existência de uma condição “normal”, representada pelo maior percentual de pessoas na curva da normalidade e uma condição de “desvio”, representada por pequenos percentuais de pessoas, na mesma curva.
Assim, segundo a autora, “o local típico de residência é o lar privado do indivíduo; o modelo educacional normal (típico) é a educação convencional, numa sala de aula comum; o modelo típico de emprego é o competitivo, para o auto-sustento. Em contraste marcante com tais arranjos – na extremidade anormal do continuum de serviços – têm se congregado as instituições totais, o ensino segregado e a não participação no mercado de trabalho “ (p. 5).
Em função do incômodo representado pela institucionalização em diferentes setores da sociedade e à luz das concepções de “desvio” e de “normalidade” é que foi se configurando, gradativamente, um novo paradigma de relação entre a sociedade e a parcela da população representada pelas pessoas com deficiência: o Paradigma de Serviços.
Este teve, desde seu início, o objetivo de “ajudar pessoas com deficiência a obter uma existência tão próxima ao normal possível, a elas disponibilizando padrões e condições de vida cotidiana próxima às normas e padrões da sociedade.” (American National Association of Rehabilitation Counseling - A.N.A.R.C., 1973).
É interessante observar manifestações que acompanharam o movimento de construção e implementação do novo paradigma, nas palavras de autores da época, em países em que tal processo estava ocorrendo. Nos Estados Unidos, por exemplo, Jones et al (1975) apontaram dois problemas prinicpais provocados pela desinstitucionalização em massa:
1. “sabemos muito pouco sobre o que acontece com pessoas com deficiência mental, quando estas são tratadas como normais” (p. 190)
2. “o processo de normalização se torna mais tenso quando concentra pacientes que não se ‘encaixam’ na política da desinstitucionalização; quando concentra profissionais cujas atitudes faz deles pessoas incapazes de administrá-la e finalmente e quando impõe a ambos expectativas que são manifestamente irrealistas” (p. 190).
Valerie J. Bradley (1978) também tratou de problemas resultantes da implementação de um programa de desinstitucionalização mal planejado:
1. insegurança dos pais – pais que vêm seus filhos sendo retirados de uma instituição e encaminhados para serviços na comunidade, os quais, por diferentes razões não são capazes de oferecer um cuidado global e estável
2. sistema de financiamento – a falta de uma abordagem sistemática ao desenvolvimento e à expansão de recursos obriga entidades a se apoiar em uma variedade de fontes de financiamento, as quais freqüentemente impõem exigências e expectativas conflitantes
3. prestadores de serviço irritados – funcionários de instituições, temendo perder seus empregos devido ao movimento da desinstitucionalização, formaram um núcleo de oposição a essas atividades
4. baixa confiabilidade – o esforço de descentralizar o sistema, através da transferência das pessoas das instituições para serviços da comunidade, tem provocado lacunas na competência com que tais pessoas são cuidadas. Novos mecanismos têm se mostrado necessários após a pessoa já estar na comunidade
5. o papel do setor privado – a competição e outros conflitos entre provedores de serviços nos setores públicos e privados dividiram os esforços e têm obstruído o desenvolvimento de recursos para as pessoas com deficiência.
Muitas manifestações surgiram do mundo acadêmico, do espaço profissional e da comunidade leiga que vivenciava as conseqüências do processo. Por força de tais reflexões e críticas, foi-se desenvolvendo uma nova concepção de institucionalização.
Considerando a tendência da sociedade de se afastar do modelo anterior e a necessidade de se planejar um sistema de recursos e serviços na comunidade, Braddock (1977) e Bradley (1978) defendiam que:
1. era necessário prevenir encaminhamentos inadequados a instituições totais
2. a prevenção devia ser acompanhada pela descoberta e desenvolvimento de métodos alternativos para o cuidado e o tratamento da pessoa com deficiência na comunidade
3. era necessário promover-se a reforma de programas institucionais
4. o retorno de todos os residentes à comunidade devia ser antecedido por um preparo, feito através do desenvolvimento de programas de habilitação e de treinamento para que pudessem funcionar adequadamente na vida em comunidade
5. se estabelecesse e mantivesse um ambiente residencial responsivo que protegesse os direitos humanos e civis da pessoa com deficiência e que contribuísse com o rápido retorno da pessoa à vida normal na comunidade
Em suma, a literatura da época, nos países do mundo ocidental que primeiro vivenciaram o processo da desinstitucionalização, indica que interesses de diferente origem e natureza se congregaram na determinação da construção do processo. Poder-se-ia dizer que a luta pela defesa dos direitos humanos e civis das pessoas com deficiência utilizou-se das brechas criadas pelas contradições do sistema sócio-político-econômico vigente (o qual defendia a diminuição das responsabilidades sociais do Estado e buscava diminuir o ônus populacional) para avançar na direção de sua integração na sociedade.
Tal processo, fundamentou-se, então, na ideologia da normalização, que representava a necessidade de introduzir a pessoa com deficiência na sociedade, ajudando-a a adquirir as condições e os padrões da vida cotidiana o mais próximo do normal, quanto possível. O princípio da normalização, portanto, deu o apoio filosófico ao movimento da desinstitucionalização, favorecendo tanto o afastamento da pessoa das instituições, como a provisão de programas comunitários planejados para oferecer serviços que se mostrassem necessários para atender a suas necessidades.
Como principais resultantes do movimento começaram a surgir novas alternativas institucionais, então denominadas organizações ou entidades de transição – mais protegidas do que a sociedade externa, conquanto menos protegida e menos determinante de dependência que uma instituição total típica.
Tais entidades foram planejadas e delineadas para promover a responsabilidade e enfatizar um grau significativo de auto-suficiência da pessoa com deficiência, através do trabalho ou do preparo para o trabalho, envolvendo treinamento e educação especiais, bem como um processo de colocação cuidadosamente supervisionado.
O ambiente social planejado, que em muitos casos se constituía de experiências de pequenos grupos especiais, era visto como instrumento fundamental para a promoção da normalização do indivíduo.
Ao se afastar do paradigma da institucionalização (não mais interessava sustentar uma massa cada vez maior de pessoas, com ônus público, em ambientes segregados; interessava desenvolver meios para que estes pudessem retornar ao sistema produtivo), criou-se o conceito da integração, fundamentado na ideologia da normalização, a qual advogava o “direito” e a necessidade das pessoas com deficiência serem “trabalhadas” para se encaminhar o mais proximamente possível para os níveis da normalidade, representada pela normalidade estatística e funcional. Assim, integrar, significava, sim, localizar no sujeito o alvo da mudança, embora para tanto se tomasse como necessário mudanças na comunidade. Estas, na realidade, não tinham o sentido de se reorganizar para favorecer e garantir o acesso do diferente a tudo o que se encontra disponível na comunidade para os diferentes cidadãos, mas sim o de lhes garantir serviços e recursos que pudessem “modificá-los” para que estes pudessem se aproximar do “normal” o mais possível.
Como exemplos das organizações provenientes dessa filosofia tem-se, por um lado, as Casas de Passagem e os Centros de Vida Independente; no âmbito da educação, as escolas especiais e as classes especiais, mais claramente voltadas para o ensino do aluno visando sua ida ou seu retorno para as salas de aula denominada normais; na área profissional, os melhores exemplos são as oficinas abrigadas e os centros de reabilitação.
Nestas, equipes de diferentes profissionais oferecem treinamento para a vida na comunidade, tais como atividades da vida diária (higiene, cuidados pessoais), atividades de vida prática (preparo de alimentos, limpeza doméstica, planejamento orçamentário, administração orçamentária) e outras habilidades consideradas necessárias para sua sobrevivência e para a vida independente.
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